domingo, 12 de abril de 2015

Esquema de Leitura: O tempo das vítimas, de François Hartog.

Universidade de Brasília - UnB
Centro de Desenvolvimento Sustentável - CDS
Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Sustentável 
Doutorado
Disciplina: Dimensão histórico-sociológica do constitucionalismo (DIR)
Professores: Cristiano Paixão e José Otávio Guimarães
Discente: Juliana Capra Maia
Esquema de Leitura:
HARTOG, François. “El Tiempo de las Víctimas”, em Revista de Estudios Sociales, n. 44, Bogotá: dez. 2012, p. 12-19.


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** Memória >> 
  • Fato, dever, arma, duelo, trauma, catarse.
  • Poder de evocação do passado no presente.
  • Ponte entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos.
  • Alternativa à História, dado que a História de hoje é uma narrativa do Estado, da nação, dos vencedores, e não a narrativa dos vencidos, dos esquecidos e dos colonizados (História como ficção opressiva).
  • Alternativa terapêutica. 



** Da vítima antiga à vítima moderna >> 
  • Nas religiões antigas, a vítima é objeto de sacrifício em favor das divindades. 
  • Dessacralização do mundo >> Deificação da Nação >> Auto-sacrifício dos nacionais que, por isso, tornam-se "heróis". Economia da glória. 

"Al mismo tiempo, lo sagrado pudo desplazarse facilmente hacia la noción de patria, por la cual era legítimo y glorioso sacrificarse. La retorica guerrera de la primera mitad del siglo XX lo cantó y lo proclamó (MACHO, 2007). La patria tiene el derecho de reclamar el sacrifico de sus hijos, a los que a cambio les concede, en las honras fúnebres, la distinción de héroes". Pp. 12.

  • Primeira Guerra Mundial >> Religião civil de sacrifício. Escola de servidão voluntária que nutriu os totalitarismos.
  • Pós Segunda Guerra Mundial >> Desaparecimento da economia da glória e da religião civil do sacrifício. Ruptura da associação entre vítima e herói. A palavra "vítima" passa a assumir uma conotação passiva e negativa.



** As condições do deslocamento >> 
  • Nuremberg >> Reconhecimento do direito à reparação individual em decorrência de guerra, não somente da reparação de Estado (vencido) para Estado (vencedor).
  • Ação pública imprescritível em crimes lesa-humanidade. Regime de imprescritibilidade reconhecido pela grande maioria dos Estados.
  • "Imprescritibilidade" significa que o criminoso continuará sendo contemporâneo do seu crime até a sua morte.  
 
"La imprescritibilidad 'natural' del crimen contra la humanidad instaura una 'atemporalidad juridica' en virtud de la cual el criminal fue, es y será contemporáneo de su crimen hasta su ultimo aliento". Pp. 13.

  • "Imprescritibilidade" dos crimes lesa humanidade << >> judicialização do espaço público. 


** Uma nova figura >> 
  • Testemunha >> Voz e rosto da vítima. Um sobrevivente a quem se escuta, a quem conferimos a palavra, a quem filmamos.
  • Coleta direta de testemunhos para reconstruir determinada realidade >> O historiador torna-se não apenas dispensável, como nocivo, dado que o ideal é que nada "venga a parasitar el cara a cara entre el testigo y el espectador, un espectador que a su vez es llamado para convertirse en testigo del testigo, un testigo delegado". Pp. 14. 
  • Anos 1990. Vítima << >> Trauma. Até então, o conceito de trauma não circulava fora dos circuitos psicológicos e psiquiátricos. 
  • Duas faces da mesma moeda: reivindicação do trauma e reconhecimento da vítima.
  • Com o trauma, se abre uma nova linguagem do acontecimento, uma nova relação com o tempo, com a memória, com a dúvida, com o sofrimento e com aqueles que sofrem.

Já não se morre pela França, mas por causa da França. 

  • A transformação do status da vítima traz consigo releituras e o redescobrimento de episódios históricos.


** Vítima e justiça: um único presente >> 
  • O surgimento da vítima está relacionado ao peso do presente no nosso tempo. Vítima << >> Presentismo.
  • Justiça transicional >> Coloca a vítima e o algoz cara a cara, para que o tempo possa colocar-se novamente em marcha. Situada entre o "antes" e o "depois" de uma situação traumática. Cria um tempo intermediário, por meio de sua ação de "construir uma ponte entre o passado e o futuro". 
  • Proliferação das Comissões da Verdade, após a experiência da África do Sul. No Brasil, a Comissão da Verdade foi instaurada em 2011, para apurar os crimes políticos praticados entre 1946 e 1975 (?).
  • Nos diversos julgamentos de crimes lesa-humanidade, ocorridos entre 1987 e 1998, na França, ficou claro que o "tempo" também estava em jogo. 
  • Acusado e vítima estão presos em um tempo petrificado, um tempo que não pode passar. Aqui, o sofrimento não submerge para o passado. Ele permanece como eterno presentem do qual é impossível se desprender. 
  • Memória >> Novo campo de ação pública internacional. E bombástico. Vide o caso do Leste Europeu, extremamente dividido em relação à sua memória.
  • Indenizações >> Substituição do direito repressivo pelo direito restitutivo. O prejuízo se converte em dívida, suscetível de avaliação. Ao saldar essa dívida, se "liquida" a história.


Provocação de Hartog: ao pretender ajustar as contas e fazer uma economia da História, não se corre o risco de passar do imprescritível ao interminável, transmutando-se a justiça, mesmo sem querer, em instrumento presentista?



Memória, crime lesa-humanidade, trauma e reparação se convertem em elementos que participam da fabricação do tempo das vítimas, que é o nosso tempo, o tempo em que reina o presente.



** Presentismo >> 
  • Configuração inédita. Nova maneira de nos relacionarmos com o tempo.
  • Não se sabe se é uma configuração inédita ou transitória.
  • O presente absorve as categorias de passado e de futuro, categorias que se tornaram obsoletas.  
  • O presente se cerca de conceitos mais ou menos destemporalizados, tais como modernidade, pós-modernidade, globalização e crise. 
  • Marcel Gauchet: presentismo é uma mudança na relação com a História, que adotou a forma de crise do futuro e da qual o desvanecimento da ideologia revolucionária é somente o sintoma mais chamativo.
  • Mudança nos pontos de referência >> O passado está cada vez mais longínquo e se reporta aos primórdios da espécie humana. O futuro, por sua vez, está fechado, restrito. É um futuro de tragédias que dificilmente poderão ser contidas pela ação humana no presente. Impotência humana perante o futuro. 

domingo, 5 de abril de 2015

Esquema de leitura: Entrevista com Hans Ulrich Gumbrecht, Cristiano Paixão e José Otávio Guimarães.

Universidade de Brasília - UnB
Centro de Desenvolvimento Sustentável - CDS
Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Sustentável / Doutorado
Disciplina: Dimensão histórico-sociológica do constitucionalismo (DIR)
Professores: Cristiano Paixão e José Otávio Guimarães
Discente: Juliana Capra Maia
Esquema de Leitura.
Referência: PAIXÃO, Cristiano & GUIMARÃES, José Otávio. “Entrevista – Hans Ulrich Gumbrecht”, em Humanidades (presente-tempo-presente), n.58, Brasília: Edunb/SESC-DF, jun. 2011, p.16-21.

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** Entrevistado >>> Hans Ulrich Gumbrecht. 
  • Universidade de Bochum, Alemanha. 
  • Universidade de Siegen. 
  • Universidade de Stanford. Foco: campo não-hermenêutico. Materialidades da comunicação, história da mídia, do esporte e do público.  



** Livros >>> 
  • Corpo e Forma.
  • Modernização dos sentidos.
  • Em 1926: vivendo no limite do tempo.
  • As funções da retórica parlamentar na Revolução Francesa.
  • Elogio da beleza atlética.
  • Graciosidade e estagnação.
  • Produção de presença: o que o sentido não consegue transmitir.
  • Lento presente: sintomatologia del nuevo tempo historico.



** Principais ideias trazidas na entrevista >>> 
  • Presença << >> Presente. A presença exige proximidade espacial e simultaneidade temporal, motivo pelo qual está associada ao presente.
  • Presença e cultura do século XXI. A presença nunca foi tão desnecessária, tão secundária, quanto no início do século XXI. Nosso mundo, desde o início da Modernidade, exige cada vez menos presença. 
  • Resposta dos homens aos tempos modernos, de desencantamento e de abstração progressiva do mundo: participação cada vez maior do espectador. Reação subconsciente.   
  • A partir do terceiro quarto do século XX, as premissas temporais por meio das quais as culturas ocidentais operam foram profundamente modificadas ("Pós-modernidade"?). A humanidade movia-se, deixando o passado para trás e em direção a um futuro sorridente.  


Pressupondo que era a "humanidade" [...] que se "movia através da história" (e não os três horizontes temporais), o passado costumava ser um passado que sempre "deixávamos para trás", e cujo valor e poder como orientação e parâmetro para ações presentes e futuras desapareciam à medida que aumentava a distância em relação a ele. Do lado do futuro, o cronótopo historicista [...] via um horizonte totalmente aberto de possibilidades, entre as quais o sujeito humano (e sua ação) poderia simplesmente selecionar e escolher. Entre esse passado e esse futuro, o presente do cronótopo historicista se reduzia a um 'momento de transição imperceptível', no qual o sujeito, usando a experiência do passado como orientação, deveria fazer escolhas entre as possibilidades oferecidas pelo futuro. Esse presente 'imperceptivelmente curto' -- em que o futuro tinha de ser escolhido com base na experiência do passado -- tornou-se, por assim dizer, o habitat episetemológico natural do sujeito moderno, altamente cartesiano (ou seja, livre de sua dimensão corporal). [...]. Hoje, claramente, e em grande medida por força das novas tecnologias, especialmente as eletrônicas, não deixamos mais o 'passado para trás' . Ao contrário, nosso presente parece constantemente inundado de materiais do passado. Ao mesmo tempo [...] nosso futuro não se apresenta mais como um 'horizonte aberto de possibilidades entre as quais podemos escolher'. Nosso novo futuro, pelo contrário, carrega ameaças de explosões demográficas [...], de implosões econômicas, de uma nova escala de catástrofes naturais, além de muitos outros cenários desoladores. Entre esse futuro bloqueado [...] e aquele passado que nunca retrocede e que nos inunda, o presente se transformou em um presente amplo de simultaneidades (ou, como se diz em espanhol, más lento), no qual tudo e todos se conectam na contemporaneidade. PP. 18.  

  • Presente do século XXI >>> Não conseguimos deixar nada para trás. Estamos todos disponíveis de modo instantâneo e imediato para pessoas de todo o planeta e somos potencialmente contemporâneos de mais acontecimentos do que o éramos no passado. Somos contemporâneos de mais acontecimentos que ocorrem no presente. Mas também somos contemporâneos de mais fatos passados, que simplesmente continuam à disposição nas fontes eletrônicas de armazenamento de informações.
  • Valorização e celebração da presença física, apesar da existência de outras formas mais baratas e mais flexíveis de interagir.  
  • Por um lado, o presente amplo é uma realidade esmagadora. Por outro lado, ele parece ser uma realidade que nos liberta do passado que acorrentava os indivíduos em suas respectivas culturas. 
  • História do presente >>> Descrever, com o máximo de precisão, cada cronótopo em que estamos vivendo. Abordagem histórica em que o "presente" se divide em diversos cronótopos. 

Esquema de Leitura: O que é ser contemporâneo?, de Vincent Descombes

Universidade de Brasília - UnB

Centro de Desenvolvimento Sustentável - CDS
Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Sustentável / Doutorado
Disciplina: Dimensão histórico-sociológica do constitucionalismo (DIR)
Professores: Cristiano Paixão e José Otávio Guimarães 
Discente: Juliana Capra Maia 
Esquema de Leitura. 
Referência: DESCOMBES, Vincent. “O que é ser contemporâneo?”, em Humanidades (presente-tempo-presente), n.58, Brasília: Edunb/SESC-DF, junho 2011, p. 132-141.

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** Sob a perspectiva filosófica, há duas concepções de "contemporâneo" >>>
  • Filosofia da História. Dianteira do mundo moderno. É o que há de mais moderno no moderno.
  • Concurso entre as várias mudanças atuais. Sob essa perspectiva, há um problema elementar da História Contemporânea, que é o problema da posição do historiador, dada a parcialidade da testemunha (parcialidade da testemunha versus imparcialidade da posteridade).

"A cor da contemporaneidade se refere inicialmente às paixões do historiador do presente, paixões que ele partilha com os atores. Isso quer dizer que há uma modalidade afetiva própria do contemporâneo. As paixões experimentadas pelos atores são paixões dos contemporâneos, pois essas paixões nascem do fato de o caso não estar decidido, de os acontecimentos em curso não serem ainda fatos realizados". Pp. 135.



"O passado pode ser lamentável ou memorável. O futuro pode ser desejável ou temível. Do ponto de vista afetivo, o contemporâneo é marcado por seu caráter irritante, doloroso ou delicioso". Pp. 135.



** Kierkegaard >>> Os acontecimentos epocais, de dimensão histórico-mundial, não possuem testemunhas. Em relação às coisas efetivamente decisivas, não se poderia falar, portanto, rigorosamente, em contemporaneidade.

Os contemporâneos assistiram aos acontecimentos do nosso passado, mas eles não possuem privilégios sobre nós em relação ao significado desses acontecimentos. Damos sentido aos acontecimentos dizendo o que são para nós. Eles mesmos atribuíram-lhes sentido ao decidir o que esses acontecimentos deveriam ser um dia para nós. [...]. O contemporâneo que atribui um sentido ao que foi vivenciado é alguém que levanta uma hipótese arriscada sobre o que será o julgamento da posteridade. Ele possui, portanto, em relação ao acontecimento, o status de alguém que vem após os fatos. Ainda que tenha sido um agente dos acontecimentos, fala deles como faria um intérprete posterior. Os acontecimentos são, também para o contemporâneo, um "texto" recebido e do qual ele nos oferece sua "leitura". Pp. 137. 

** A cronologia abstrata  define somente uma contemporaneidade indiferente.


** Atualidade histórica >>>

  • Para que duas atividades possam ser consideradas efetivamente contemporâneas, é preciso que o fato de ocorrerem no mesmo espaço temporal possa afetar tanto o modo como essas atividades se desenvolvem quanto os seus resultados. É preciso, pois, que a sua relação de contemporaneidade seja um fato histórico.
  • Concurso histórico de processos em curso, fonte de interferências mútuas. 
  • O contemporâneo apresenta-se como conjunto de atividades que, ocorrendo ao mesmo tempo, se contradizem (competição) ou se reforçam (cooperação) umas às outras. 


** Contemporaneidade >>>
  • Não é uma propriedade, uma qualidade ou um conjunto de qualidades que se poderia esperar fixar em um tipo ideal. As tentativas de definir um arquétipo do contemporâneo pressupõem a existência de uma essência histórica comum a todos os atores presentes na mesma cena. Ocorre que há de tudo na cena histórica: o tradicional, o moderno, o arcaico, o antigo...
  • Não é uma relação entre pessoas ou entre objetos históricos. É uma relação entre processos, entre mudanças, entre atividades. 
  • A grande questão, portanto, não residiria em encontrar os traços epocais da modernidade avançada. "A grande questão é [...] a de saber em que condições se produz para nós, no mundo que é o nosso, o concurso temporal das diferentes mudanças em concurso e das diferentes ações engajadas que compõem a nossa atualidade". pp. 141.   

Artigo publicado em periódico. De naturalista a militante: a trajetória de Rachel Carson

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