segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Esquema de leitura: O canto do Dodô, David Quammen

Universidade de Brasília - UnB
Centro de Desenvolvimento Sustentável
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Sustentável
Doutorado
Disciplina: Biologia da Conservação
Professores: José Augusto Drummond e José Luiz de Andrade Franco
Aluna: Juliana Capra Maia
Ficha de leitura
Referência: QUAMMEN, David. O canto do dodô: biogeografia de ilhas numa era de extinções. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. Cap. 01. 

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TRINTA E SEIS CAPACHOS PERSAS
** Metáfora. Um tapete persa cortado em 36 pedaços ainda é um tapete persa? Não. Cada um dos pedaços começa imediatamente a se desfazer. O mesmo se aplica aos ecossistemas.


** Desemaranhamento de ecossistemas, relaxação para o equilíbrio, colapso faunístico, colapso florístico, decaimento de ecossistemas (Thomas Lovejoy).


** Há 30 anos, os ecólogos já alertam que os ecossistemas estão se desemaranhando. E o vislumbre do futuro lhes conclama à ação. Mas o debate tem ficado restrito à Academia: os cientistas estão discutindo entre si.


** Biogeografia de ilhas. Elucidação dos processos de extinção de espécies.


O HOMEM QUE CONHECIA ILHAS
** Biogeografia. Disciplina que estuda os fatos e os padrões de distribuição das espécies. Norteada pelas perguntas: Quais espécies? Onde? Por que? Por que não?


** Ilhas: “abrigos e áreas de acasalamento para o estrambótico e o anômalo. São laboratórios naturais de extravagante experimentação evolucionária”. P. 19, motivo que faz delas um lugar especial no estudo da evolução.

“Ilhas são particularmente instrutivas porque sua área limitada e seu isolamento inerente combinam-se para realçar claramente os padrões da evolução [...]: as ilhas esclarecem a evolução”. P. 20.

** Alfred Wallace, Joseph Hooker e Charles Darwin. Insights diante da contemplação da fauna de ilhas.


** Biogeografia de ilhas: catálogo de excentricidades. Tartarugas gigantes, hipopótamos pigmeus, aves que não voam, etc.


** Textos que são referência na biogeografia de ilhas: Island Life (Wallace); A Origem das Espécies (Darwin) e A Teoria da biogeografia de ilhas (MacArthur e Wilson).


** Alfred Russel Wallace. Inglês modesto, de origem humilde e autodidata. Tornou-se o maior biólogo de campo do século XIX. Ficou injustamente conhecido apenas como o homem que foi obscurecido por Charles Darwin, o que omite que ele foi um dos grandes patriarcas da biogeografia.

** Expedição de Wallace, por 8 anos, no arquipélago Malaio. Descoberta do que mais tarde seria chamado “Linha de Wallace”:

“[...]. Para os primeiros biogeógrafos, era como se essas duas ilhas irmãs, Bali e Lombok, pertencessem a dois domínios diferentes. A oeste da linha divisória viviam tigres e macacos, ursos e orangotangos, capitães-de-bigode e surucuás; a leste, achavam-se frades, cacatuas, aves-do-paraíso e martins-pescadores do paraíso, além de cuscus e outros marsupiais [...]. Bali e Lombok eram duas pequenas ilhas – similares em tamanho, topografia e clima, alinhadas praticamente ombro a ombro – onde as diferenças zoológicas se mostravam mais claramente delineadas”. P. 26 e 27.

** Segredo: profundidade das águas. Bali está na plataforma continental e já havia sido unida por terra a Java, Bornéu, Sumatra e a península da Malásia. Lombok, por sua vez, está verdadeiramente em alto mar.


** “O estreito entre Bali e Lombok foi um dos locais em que a biogeografia começou a se constituir”.  P. 27.


** Biogeografia de ilhas >> Isolamento, especiação, dispersão. Toda ilha é inerentemente isolada. Esse isolamento propicia a especiação, processo por meio do qual uma espécie se divide em várias. Algumas criaturas conseguem vencer o isolamento das ilhas, contudo. A esse fenômeno, denominamos “dispersão”.


** Especiação é uma palavra moderna. Na época de Darwin ou de Wallace, ela simplesmente não fazia sentido.

“Acreditava-se que um Deus havia criado todas as espécies a partir do nada e as colocara na Terra numa disposição requintadamente ilógica [...]. Supunha-se que, de algum modo, tais arranjos condiziam com os caprichos divinos. Até meados do século XIX, a biogeografia serviu apenas para provar que os padrões adotados pela deidade eram desarticulados e inescrutáveis”. P. 29.

** Fevereiro de 1855. Wallace estava em Sarawak. Refletia sobre a origem das espécies. Entendia que os dados biogeográficos nunca haviam sido utilizados para tentar responder à questão da origem das espécies. Eram apenas curiosidades de bibliotecas e museus, originárias das eras das descobertas.


** A era das descobertas e o inventário da fauna das novas terras colocou alguns dogmas religiosos em perspectiva:
1) “Deus supostamente havia parado de criar após o sexto dia. Agora, porém, à medida que o mundo se ampliava e mais e mais dados biológicos se acumulavam, era como se Deus tivesse permanecido mais ocupado do que qualquer um poderia ter imaginado”. P. 32. 

2) "Um dos dogmas teológicos ameaçados por tal inventariação abrangente foi a história da arca de Noé, do Gênesis. Uma embarcação literal, não simbólica – e, portanto, finita, não infinita --, só poderia ter carregado um certo número de passageiros, mesmo que medisse trezentos por cinquenta cúbitos. Se antes a arca já estava cheia, com esse novo rol de animais ela se tornava irremediavelmente abarrotada”. P. 32.

“A arca foi o primeiro caso de overbooking da história”. P. 37.

3) Falhas do dogma sobre o Monte Ararat.

“Outro dogma [a ser ameaçado pelas descobertas] foi a montanha onde a arca teria encalhado e sido descarregada depois que as águas baixaram. O credo convencional situava essa montanha no leste da Turquia – Monte Ararat, como nós o conhecemos, embora o Gênesis não dê nenhuma coordenada geográfica. Se o plantel de Noé se dispersou a partir do leste da Turquia, as anomalias de distribuição da fauna do mundo não podem ser explicadas. Se todos os animais sobreviventes desembarcaram no Monte Ararat depois do dilúvio, como as várias espécies chegaram aonde chegaram?.
No plano mais simples, era um problema de dispersão. Como as emas, incapazes de voar, foram da Turquia para a América do Sul? Teriam caminhado? Como os ursos polares atingiram o Ártico, visto que necessitam de baixa temperatura, oceanos congelados e focas apetitosas? Deve ter sido uma passeata longa, esfaimada e calorenta pelo Cáucaso... Como esses impertinentes cangurus alcançaram a Austrália? Até onde essas criaturas traquinas seriam capazes de saltar?
Num plano mais complexo, o problema também abrangia descontinuidade nos padrões de distribuição. Se os cangurus saltitaram de Ararat até a Austrália, por que nenhum permaneceu na Ásia? Se as cacatuas saíram voando da arca (como o corvo e a pomba em sua missão de reconhecimento em busca de terra seca) e rumaram para sudeste, por que se deslocaram até Lombok antes de pararem e fixarem morada? Por que haviam desdenhado todas as terras intermediárias? O que havia de tão repelente, digamos, em Bali? P. 37.


** Um dos primeiros a perceber o furo do dogma sobre o Monte Ararat foi Lineu. Tentando remendar, ele acabou fomentando a ideia de “criação especial”, segundo a qual Deus se envolveu até nos mais insignificantes aspectos da criação da fauna e da flora.

“[...]. A teoria da criação especial foi uma concepção ontológica cabal, que resolvia tudo e não resolvia nada. Nascida de interpretações errôneas mas nem por isso menos cativante, tornou-se logo a nova ortodoxia e perdurou por tempo suficiente para que Darwin e Wallace viessem a contestá-la”. P. 39.


** Johann Reinold Forster, da escola e Lineu. Discerniu a relação entre espécies e área: “as ilhas possuem um número maior ou menor de espécies conforme sua circunferência seja mais ou menos extensa”. P. 42. 


** “Sobre a lei que regula a introdução de novas espécies”. Monografia escrita por Wallace e marco histórico da biologia evolutiva. Trabalho publicado em um periódico de renome.
  • Frase de impacto: “Toda espécie surge coincidindo no espaço e no tempo com uma espécie preexistente à qual está proximamente aparentada”. P. 49. Espécies proximamente aparentadas surgem não apenas perto umas das outras, mas a partir umas das outras.
  • As espécies evoluem. Isso demanda tempo e isolamento.
  • Classificações:
a) Antigas versus novas. Ilhas mais antigas possuem maior endemismo.

b) Pequena versus grande. Em regra, ilhas grandes abrigam mais espécies que as pequenas.

c) Continental versus oceânica. “Numa ilha oceânica, todo animal terrestre e toda planta descendem de um animal ou planta que lá chegou por dispersão aquática posterior à formação da ilha. Uma ilha continental como Bali ou Madagascar, por outro lado, já possui uma comunidade inteira de espécies terrestres no momento de seu isolamento”. P. 57.

** Nessa época, Wallace e Darwin começam a se corresponder.


** Wallace era um outsider da biologia. Vendia espécimes da fauna e da flora para sobreviver, o que lhe diminuía o prestígio. Além disso, não participava dos encontros das sociedades científicas de sua época, até porque estava em campo, viajando.
  • 1848. Viagem para a Amazônia. Financiaria as suas despesas por meio da coleta e comercialização de espécimes locais. Wallace permaneceu na Amazônia por 4 anos. Adaptou-se à vida na floresta: comia e bebia como um nativo, falava português, dormia em redes, lutava contra a malária, contra os bichos de pé. Enquanto isso, colecionava e desenhava espécimes da fauna local.

** Ao visualizar uma onça preta, Wallace percebeu na Amazônia as variações intra-espécies. Isso era bastante difícil em uma época dominada pelo pensamento tipológico. Ele as percebia com clareza até por imperativo da profissão: além de colecionador, era um comerciante de espécimes. Logo, tinha interesse em exemplares redundantes.
  • Problemas enfrentados por Wallace: preservar e despachar os lotes de espécimes para a Inglaterra.
  • Enquanto estava no alto do Uaupés, armazenava espécimes, anotações, diários em Barra (Manaus).
  • Todos esses tesouros amazônicos foram perdidos na viagem de volta para a Inglaterra. O navio em que Wallace embarcou acabou por pegar fogo e naufragou. Sobreviveu a esse naufrágio por sorte, sendo resgatado após 10 dias em um barco salva vidas cheio de buracos. 4 dias após chegar a Inglaterra, já estava pensando em novas viagens para ilhas tropicais ou para as montanhas.

“Embora seus espécimes e quase todas as suas anotações tivessem sumido, os anos que Wallace passou na Amazônia não foram desperdiçados. Muitas de suas observações puderam ser recuperadas de memória e as cartas enviadas a Samuel Stevens. Graças ao processo de coletar espécimes redundantes, aguçara a vista para as variações intra-espécie. Desenvolvera novas técnicas de pesquisa de campo. Adquirira habilidades de sobrevivência apropriadas para os trópicos. E adquiriu um insight seminal, a saber, que os padrões e distribuição da flora e da fauna são importantes”. P. 77.


** Distribuição da flora e da fauna: normalmente era delineada por algum tipo de barreira geográfica. Exemplo: cadeia de montanhas, rios largos, descontinuidade de vegetação.
  • “Ele notara que duas espécies similares de animais, proximamente aparentadas, muitas vezes ocupam lados opostos dessa fronteira”. P. 78.
  • Com base nisso, começou a coletar dados biogeográficos (onde se situava determinada espécie), informação normalmente negligenciada pelos naturalistas do seu tempo.
  • Observação de Wallace, com base na distribuição de macacos amazônicos: os rios Negro, Amazonas e Madeira formavam fronteiras raramente ultrapassadas por certas espécies. Desde então, passou a enxergar a bacia amazônica como um arquipélago: quatro grandes ilhas separadas por água doce (ele as chamou Guiana, Equador, Peru e Brasil). “Transcendência da insularidade”.
  • Publicou dois livros enquanto estava na Inglaterra: “A narrative of travels on the Amazon and Rio Negro” e “Palm trees of the Amazon and their uses”.

** Decaimento de ecossistemas. Experimento de Thomas Lovejoy, na Amazônia brasileira. Áreas desmatadas para a criação de gado bovino e estudo da fauna remanescente nas reservas legais.

** Por motivos científicos e pressões financeiras, Wallace decidiu viajar para um mundo de ilhas tropicais. Sabia que seriam locais onde encontraria coisas raras e peculiares. Por isso, dirigiu-se ao arquipélago malaio. Ficou nessa região por 7 anos.
  • Coleta de espécimes na Malásia continental, por 6 meses.
  • Mudou-se, então, para Sarawak, no litoral noroeste de Bornéu.
  • Navegou para Bali e atravessou o canal para Lombok. De lá, seguiu para a ilha Célebes. Finalmente, em 1857, seguiu para as ilhas Aru, situadas 1600 km a leste.

** Durante uma febre, Wallace teve uma epifania. Ocorreu-lhe que os freios populacionais citados por Malthus (guerra, doença, fome, etc.) agem sobre humanos, mas também sobre animais. Daí, Wallace formulou a ideia de sobrevivência dos mais aptos: os indivíduos eliminados por esses freios devem, de algum modo, ser inferiores aos que sobreviveram.
  • Ao invés de mandar essa descoberta para o seu entreposto, Wallace resolveu remetê-la por carta a Charles Darwin (!!!), pedindo a opinião daquele biólogo a quem admirava.
  • Na época em que recebeu a carta de Wallace, Darwin já trabalhava em seu tratado sobre evolução há vinte anos. O mecanismo da evolução -- a seleção natural -- era a sua pérola, a sua grande descoberta. Tal como Wallace, Darwin também foi influenciado por Malthus para chegar à seleção natural.  
  • Arranjo elaborado por Lyell e Hooker para manter a primazia da descoberta de Charles Darwin. Publicação das descobertas paralelas de Darwin e Wallace na Sociedade Lineana, em 01/07/1858.

Artigo publicado em periódico. De naturalista a militante: a trajetória de Rachel Carson

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