quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Ficha de Leitura: Décroissance: qual a consistência? Elimar Nascimento e Gisella Colares Gomes.

Universidade de Brasília – UnB
Centro de Desenvolvimento Sustentável – CDS
Programa de Pós Graduação
Doutorado
Disciplina: Ciência e Gestão da Sustentabilidade
Docentes: Maurício Amazonas, Elimar Nascimento, Frederick Mérténs e Thomas Ludewigs.
Discente: Juliana Capra Maia
Ficha de Leitura:
NASCIMENTO, Elimar Pinheiro do; GOMES, Gisella Colares. Décroissance: qual a consistência? Apresentado no Congresso da Associação dos Programas de Pos Graduação em Sociedade e Meio Ambiente, Cuiabá, 2009.

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** Decrescimento (décroissance) >>>
  • De acordo com Latouche, não seria um conceito ou um modelo, mas um slogan político, uma reação.
  • Reconhecimento de que o crescimento infinito não é possível, dada a finitude dos recursos naturais.
  • Propõe o abandono da religião do crescimento ilimitado; o abandono da ideia de progresso que marcou o século XIX, égide do Positivismo.
  • Propõe que todos adotemos um modo de vida mais frugal.

** Foco do artigo >>> Abordar traços centrais do conjunto de obras e autores que se autoidentificam como adeptos da corrente do decrescimento, bem como de ouros que frequentam a mesma temática sem necessariamente se considerarem pertencentes ao movimento.

** Origens históricas >>> A postura de desconfiança em relação à ideologia do progresso não é novidade. De acordo com os autores, a discussão perpassa os trabalhos dos seguintes autores:
  • Sadi Carnot: Segunda Lei da Termodinâmica, a Lei da Entropia. Textualmente: “mede a energia não disponível para o trabalho que resulta das transformações energéticas. A entropia pode ser entendida como uma medida de proximidade em relação ao equilíbrio. O equilíbrio é um estado no qual não é possível extrair energia suplementar, ou seja, um estado máximo de entropia é um estado de equilíbrio ou energia nula. O conceito de entropia também está estreitamente relacionado ao de irreversibilidade. Nos processos reversíveis a entropia permanece constante e nos irreversíveis ela cresce na direção de um máximo”.
  • Tentativa de conciliação entre socialismo e ecologia, Sergei Podolinnsky.
  • Nicholas Georgescu-Roegen, 1917. Associou a entropia às ciências econômicas.
  • Propôs a aplicação da lei da entropia ao mundo natural material.
  • Ivan Illich. Inspirador dos pós-desenvolvimentistas junto aos cientistas sociais. 
  • Inversão de efeitos quando as ações atingem determinado nível de saturação.
  • Aurélio Peccei.
  • Primeiro manifesto do Clube de Roma (Limites ao Crescimento).
  • François Partant.
  • Alain Caillé, do Mauss.
  • André Gorz, 1989.
  • Bernard Charbonneau (incluído por Latouche)
  • Cornelius Castoriadis (incluído por Latouche)

** Origens epistemológicas e antropológicas do decrescimento >>>
  • Georgescu-Roegen: Constatação da natureza entrópica das atividades econômicas, que constituem uma continuação da evolução biológica por meios exógenos aos homens. Bioeconomia. É impossível, mesmo com progressos técnicos, eliminar totalmente os efeitos entrópicos da extração, transformação e utilização dos elementos naturais. Refutação da crença no crescimento sem limites. Observou que o processo entrópico da economia industrial não é adequado ao funcionamento cíclico da biosfera.
  • Herman Daly: Proeminência na Economia Ecológica. “Os meios exosomáticos são extensões dos endossomáticos”. Tanto uns quanto outros constituem sistemas abertos, que continuamente importam energia e matéria de baixa entropia e exportam de alta entropia. Desse modo, tanto é necessário limitar o crescimento populacional (meios endossomáticos) quanto o crescimento da produção de bens materiais (meios exossomáticos).
  • Ivan Illich: Mesmo que fosse fisicamente possível, a disseminação do estilo de vida dos países desenvolvidos ao resto do mundo não seria medida recomendável. A sociedade de consumo cria necessidades prejudiciais aos seres humanos, destituindo-os de poderes e de saberes e colocando-os à mercê de instituições sobre as quais não possuem qualquer controle. “Emerge [...] a necessidade de se buscar um novo modo de viver, de se relacionar com a natureza, que só é possível se for abandonada a louca corrida criada pela ideia do crescimento a todo custo”. 

Além da natureza entrópica do processo produtivo, observa-se que é impossível universalizar o padrão de consumo dos países desenvolvidos aos quase sete bilhões de habitantes que a terra possui atualmente, pois seria necessário algo em torno de quatro planetas terra. Não há fonte energética suficiente, nem recursos naturais que possibilitem dar a cada habitante de nosso planeta uma vida similar a dos norte-americanos e europeus. Nem a bioesfera agüentaria a pressão produzida pela produção de gases poluentes, resultando em um aquecimento global crescente e de consequências imprevisíveis para toda a humanidade.
O argumento de que a produção é acompanhada da ecoeficiência, reduzindo a energia e a matéria prima na produção dos bens materiais, não considera o desencontro temporal entre o ritmo da descoberta cientifica, construção tecnológica e disseminação dos novos produtos e processos produtivos no mercado e aquele da demanda crescente e exponencial de novos grupos humanos ascendendo à modernidade, sobretudo na Ásia. E que somam mais de três bilhões de pessoas.


** A episteme desenvolvimentista >>>
  • A noção de desenvolvimento constitui um horizonte de conhecimento que limita a maneira como definimos os problemas e, portanto, como construímos as suas respectivas soluções.
  • Desenvolvimento: noção ocidental, moderna e capitalista. Nasce, embrionariamente com a Revolução Industrial, no século XIX. Dissemina-se após a Segunda Guerra, nos anos 1950, sobretudo em função dos países periféricos.
  

Disseminação do desenvolvimento como objetivo e valor
<<< >>>
Ocidentalização do mundo Universalização do capitalismo
Consumo de massas


  • Existem diversas teorias acerca do desenvolvimento. Mas o conceito de desenvolvimento sempre esteve relacionado ao crescimento econômico e ao progresso e, às vezes, à ideia de evolução. Tentativas de relacionar desenvolvimento e qualidade sempre tiveram vida curta. 

Dessa forma, todas as teorias de desenvolvimento supõem, embora de maneira diferenciada, a idéia de um aumento da produção e da produtividade da base econômica. Aumento tanto dos bens materiais quanto dos bens imateriais ou simbólicos, que pertencem ao universo da modernidade e que estão relacionados diretamente a uma máquina de produzir ou incrementar o desejo de consumir estes mesmos bens, em um círculo vicioso de mais produção, mais consumo, mais produção.


  • Críticas à episteme desenvolvimentista >>>
-- Illich. 1970. Princípio do esgotamento ou da inflexão perversa: a partir de certo momento de seu desenvolvimento, o processo torna-se irracional e prejudicial aos seus próprios atores. O desenvolvimento provoca externalidades negativas cada vez maiores e ausentes dos cálculos dos economistas e gestores públicos. Crítica à fé cega na tecnologia (tanto em sua capacidade de fazer a economia crescer, quanto em sua capacidade de substituir insumos). 
-- Hermann Daly. Também se dedicou à desconstrução da ideia de crescimento. A principal medida do crescimento econômico é o PIB. O cálculo do PIB, entretanto, não leva em consideração o princípio básico da microeconomia segundo o qual os benefícios marginais devem igualar-se aos custos marginais. No pensamento econômico convencional, o sistema econômico seria um todo passível de crescer indefinidamente. Historicamente, comprovou-se que o crescimento não leva ao desenvolvimento, isto é, não distribui a riqueza automaticamente. Ademais, na contabilização do PIB, custos reais externos são considerados como benefícios. Bens naturais são considerados bens livres. Sugestão: reintroduzir a figura do Landlord.

** Dilemas da sociedade do desenvolvimento / crescimento >>>
  • A sociedade do crescimento não é sustentável. Ela esgota os recursos renováveis para as próximas gerações e ameaça em piorar grandemente a qualidade de vida da atual.
  • A sociedade do crescimento não é desejável. Ela aumenta as desigualdades regionais e sociais; aumenta os riscos de pandemia, de contaminação, colocando em risco a própria espécie humana, senão a vida no planeta.
  • A sociedade do crescimento não produz uma qualidade de vida para a esmagadora maioria de seus componentes, pois ela cria um bem estar ilusório. Sociedade de consumo, consumo desnecessário, consumo que produz externalidades negativas para o próprio consumidor.

** As possibilidades futuras >>> Grande parte os defensores decrescimento pregam uma reforma intelectual e moral, que lembra a palavra de ordem de Gramsci nos inícios do século XX (“revolução cultural”). Criação de uma sociedade distinta, mais saudável, mais simples, mais relacional.
  • Hermann Daly >>> Economia Ecológica: Levar em conta os limites físicos da biosfera (capacidade de suporte), o que não pode ser resolvido mediante mecanismos de preço; justa distribuição; alocação de recursos.
  • Marcel Mauss >>> Teoria da Dádiva. Inspiração dos movimentos do decrescimento. A ordem social é irredutível à ordem econômica e contratual. Os interesses instrumentais (TER) são hierarquicamente secundários em relação aos interesses de SER.
  • Edgar Morin >>> La Voie ou Manifeste pour la métamorphose Du monde. Projeto de civilização no qual as mudanças são articuladas, interativas e interdependentes. Propõe reformas nas esferas política, econômica, social, do pensamento, da educação, da vida e da moral. Distribuir os ganhos de produtividade (lucros); implantar um New Deal em escala mundial.  
  • Serge Latouche >>> (1) Reduzir o consumo em geral; (2) Reciclar os produtos existentes para dispensar a produção de novos; (3) Reutilizar o que já existe; (4) Reavaliar os nossos consumos; (5) Reconceituar a nossa vida; (6) Reestruturar, adaptar as estruturas econômicas e as instituições políticas e sociais aos novos objetivos de uma sociedade convivial; (7) Redistribuir melhor os bens existentes; (8) Relocalizar a produção, o trabalho, a moradia para que o “não transporte” possa ser disseminado.

Decrescimento >>> Mudança paradigmática. Mudança na percepção, na cultura.  Ruptura. Nova utopia: “reduzir o padrão de consumo dos ricos, aumentar o dos pobres e modificar o de todas as pessoas”.

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