Universidade de Brasília – UnB
Centro de Desenvolvimento Sustentável
– CDS
Programa de Pós Graduação em
Desenvolvimento Sustentável
Ciência e Gestão da Sustentabilidade
Professores: Elimar Nascimento, Maurício Amazonas, Frederick Mértens e Thomas Ludwigs.
Professores: Elimar Nascimento, Maurício Amazonas, Frederick Mértens e Thomas Ludwigs.
Discente: Juliana Capra Maia
Ficha de Leitura: JACKSON, Jeremy B.C et. Allii. “Historical Overfishing and the Recent Collapse
of Coastal Ecosystems”. Science,
vol. 293, Julho de 2001.
Introdução
** Colapso de ecossistemas marinhos << >> Sobrepesca.
- A sobrepesca precede todas as outras perturbações humanas nos ecossistemas marinhos: poluição, degradação da qualidade da água, mudanças climáticas antropogênicas.
- O número de espécies costumava ser muito maior que o atualmente observado, circunstância pouco explorada nos estudos disponíveis.
Importância
dos dados históricos
** A maioria dos estudos acerca de ecossistemas
marinhos é realizada por meio de pesquisas in
loco. Tais pesquisas datam da década de 1950 até o presente e normalmente
desconsideram a perspectiva histórica.
** O estudo apresentado no artigo considera dados
biológicos, biogeoquímicos, físicos, biogeográficos e históricos.
** Hipótese: seres humanos vêm provocando a
degradação dos ecossistemas marinhos desde que aprenderam a pescar.
** Método: utilização de dados coletados em várias
disciplinas.
- Utilização da análise de sedimentos marinhos dos últimos 125 mil anos.
- Registros arqueológicos dos últimos 10 mil anos dos assentamentos humanos ao longo da costa.
- Registros históricos contidos em documentos, jornais e cartas desde o século 15 até os dias atuais.
- Registros de ecologia existentes na literatura científica desde os últimos cem anos até o presente.
Períodos de tempo, Geografia e análises
** Períodos de relevante impacto humano sobre
ecossistemas marinhos:
- Aborígene: exploração de subsistência sobre os ecossistemas costeiros por culturas humanas locais, mediante artefatos relativamente simples.
- Colonial: exploração sistemática dos recursos costeiros por potências mercantis estrangeiras, que incorporavam recursos naturais distantes a mercados em desenvolvimento.
- Global: exploração intensa e ubíqua dos recursos pesqueiros costeiros e oceânicos, com a finalidade de fornecer produtos para um mercado internacional. Causa, frequentemente, a exaustão e a substituição dos nichos explorados.
** Na Ásia, Europa e África esses períodos se
confundem no tempo e no espaço. Nas Américas, na Nova Zelândia e na Austrália,
entretanto, são tempos bem marcados.
Florestas de algas
** Florestas de algas constituem habitats oceânicos
de diversas espécies de peixes e de invertebrados.
** No Hemisfério Norte, as Florestas de Algas
foram sensivelmente reduzidas devido à pesca dos mamíferos que predam herbívoros.
- Peixe-boi marinho (Steller’s sea cow): espécie de grande distribuição no Pacífico Norte e praticamente extinta durante o período aborígene. Os últimos foram mortos por comerciantes de peles durante o período colonial.
- Lontra-marinha: espécie que preda ouriços do mar. Amplamente pescada pelos aborígenes. Protegida a partir do século XX. Entrou para a dieta das orcas (dado o declínio da população de focas e de leões marinhos), o que tem diminuído seu número novamente.
- Ouriços do mar: predam as florestas de algas.
Northern Pacific kelp forests
presumably flourished before human settlement because predation by sea otters
on sea urchins prevented the urchins from overgrazing kelp. Aboriginal Aleuts
greatly diminished sea otters beginning around 2500 yr B.P., with a concomitant
increase in the size of sea urchins. Fur traders subsequently hunted otters to
the brink of extinction in the 1800s with the attendant collapse of kelp
forests grazed away by sea urchins released from sea otter predation.
P. 631.
** Florestas de Algas do Golfo do Maine. A
localidade nunca teve lontras-marinhas. Entretanto, os ouriços eram predados
pelo Bacalhau do Atlântico e por outros grandes peixes.
- Apesar da pesca aborígene (com linha e anzol), as populações de ouriços e as florestas de algas permaneceram estáveis até 1920, quando a introdução de novas técnicas pesqueiras desequilibrou completamente os ecossistemas oceânicos.
- Lagostas, caranguejos e ouriços do mar cresceram em abundância, devorando as florestas de algas.
Arrecifes de corais
** Mais complexo dentre os ecossistemas marinhos,
tanto do ponto de vista estrutural quanto do ponto de vista taxonômico. Fornecem
habitats para diversas espécies de peixes e de invertebrados.
** A pesca nos arrecifes de corais começou há 40
mil anos. Não obstante, apenas nos últimos séculos as perturbações humanas
provocaram colapsos.
** Locais em que o colapso dos corais é mais
visível: Caribe e Arrecifes Australianos.
- Caribe: mortandade dos corais a partir de 1980, devido ao supercrescimento de algas. Causa: mortandade do ouriço do mar, seu último predador, devido a doenças.
- Austrália: mortandade dos corais a partir de 1960, devido à superpopulação de estrelas-do-mar. Fenômeno recente, sem registros nos períodos aborígene e colonial.
Campos marinhos subtropicais e tropicais
** Campos marinhos (sea grass) cobrem grandes extensões de
baías, lagoas e plataformas continentais. Fornecem habitats para diversas espécies
de peixes, tubarões, arraias, tartarugas marinhas.
- Assim como os arrecifes, os campos marinhos mostraram-se bastante resilientes até recentemente, quando sua mortandade se espalhou por largas extensões: Baía da Flórida, Golfo do México e Baía de Moreton, Austrália, por exemplo.
- Causas do colapso: turbidez, sedimentação e doenças. Mas essas causas foram aprofundadas pela extirpação de grandes vertebrados herbívoros, em especial a tartaruga marinha verde e os peixes-boi (dugong).
In the near absence of green turtles
today, turtlegrass beds grow longer blades that baffle currents, shade the
bottom, start to decompose in situ, and provide suitable substrate for
colonization by the slime molds that cause turtlegrass wasting disease. Deposition
within the beds of vastly more plant detritus also fuels microbial populations,
increases the oxygen demand of sediments, and promotes hypoxia […]. Thus, all
the factors that have been linked with recent die-off of turtlegrass beds in
Florida Bay […], except for changes in temperature and salinity, can be
attributed to the ecological extinction of green turtles. P.
634.
Ostras e a eutrofização dos estuários
** Ecossistemas marinhos mais degradados:
sedimentação, turbidez, hipóxia e anóxia, perda de campos marinhos, perda
generalizada do habitat das ostras, eutrofização, multiplicação de águas-vivas,
surtos de algas tóxicas.
- Chesapeake Bay, Pamlico Sound (ambos nos EUA) e Mar Báltico. A agricultura e o carreamento de sedimentos, em si, não destruíram os estuários nessas localidades. A extinção da fauna marinha, especialmente a sobrepesca mecanizada das ostras, o provocou.
Vast oyster reefs were once prominent structures
in Chesapeake Bay […], where they may have filtered the equivalent of the entire
water column every 3 days […]. Despite intensive harvesting by aboriginal and early
colonial populations spanning several millennia, it was not until the
introduction of mechanical harvesting with dredges in the 1870s that deep
channel reefs were seriously affected […]. Oyster catch was rapidly reduced to
a few percent of peak values by the early 20th century […]. Only then, after
the oyster fishery had collapsed, did hypoxia, anoxia, and other symptoms of
eutrophication begin to occur in the 1930s […], and outbreaks of oyster parasites
became prevalent only in the 1950s […]. P. 634.
Sobrepesca de ostras
|
↔
|
Degradação dos estuários
|
- Pamlico Sound: reintrodução das ostras. Finalidade: reintroduzir coletores de plâncton em suspensão, limitando o supercrescimento do plâncton e a consequente eutrofização dos estuários.
A precedência da sobrepesca dentre os distúrbios humanos causados
nos ecossistemas marinhos
** Causas
da degradação dos ecossistemas costeiros e oceânicos, em ordem de precedência cronológica
e de relevância:
- Sobrepesca
- Poluição
- Destruição mecânica de habitats (exemplo: coleta de ostras em larga escala)
- Introdução de espécies invasoras
- Mudanças climáticas.
Overfishing of large vertebrates and
shellfish was the first major human disturbance to al coastal ecosystems
examined [...]. Ecological changes due to overfishing are strikingly similar
across ecosystems despite the obvious differences in detail. […]. Their timing
in the Americas and Pacific closely tracks European colonization and
exploitation in most cases. However, aboriginal overfishing also had effects, as
exemplified by the decline of sea otters (and possibly sea cows) in the
northeast Pacific thousands of years ago.
There are three important corollaries
to the primacy of overfishing. The first is that pollution, eutrophication,
physical destruction of habitats, outbreaks of disease, invasions of introduced
species, and humaninduced climate change all come much later than overfishing
in the standard sequence of historical events […].
The second important corollary is that
overfishing may often be a necessary precondition for eutrophication, outbreaks
of disease, or species introductions to occur […].
The third important corollary is that changes
in climate are unlikely to be the primary reason for microbial outbreaks and disease.
The rise of microbes has occurred at different times and under different
climatic conditions in different places, as exemplified by the time lag between
events in Chesapeake Bay and Pamlico Sound […]. Anthropogenic climate change
may now be an important confounding factor, but it was not the original cause.
Rapid expansion of introduced species in recent decades […] may have a similar
explanation, in addition to increase in frequency and modes of transport. Massive
removal of suspension feeders, grazers, and predators must inevitably leave
marine ecosystems more vulnerable to invasion. P. 635.
** A
eutrofização dos mares e oceanos tem sido atribuída tão-somente ao acúmulo de
nutrientes e, mais recentemente, às mudanças climáticas. Dada a carência de
pesquisas com enfoque histórico, a sobrepesca tem sido negligenciada.
** Nos
períodos mais recentes a velocidade dos impactos da sobrepesca sobre os
ecossistemas aumentou exponencialmente.
** A
sobrepesca alterou sensivelmente os ecossistemas marinhos em todos os períodos
estudados: aborígene (ao contrário do comumente apregoado), colonial e global. Sobrepesca
da lontra marinha e do peixe boi marinho (cow fish) por sociedades
simples do nordeste do Pacífico há milênios (levando-os praticamente à extinção
antes do início do período colonial).
- Desse modo, eventos tais como poluição, eutrofização, destruição física de habitats, doenças, introdução e disseminação de espécies invasoras, muito mais recentes, não são suficientes para explicar os colapsos ocorridos milênios atrás.
- Extinção de espécies por meio da sobrepesca é pré-condição da eutrofização.
- Proliferação de micro-organismos nos habitats aquáticos: não é recente. Desse modo, não pode ser explicada exclusivamente pelo aquecimento global.
Efeitos sinérgicos das perturbações antropogênicas
** A
extinção de níveis tróficos inteiros torna os ecossistemas mais vulneráveis a perturbações
naturais e humanas, tais como carreamento de sedimentos, eutrofização, doenças,
tempestades e mudanças climáticas.
** O colapso
dos ecossistemas marinhos não ocorre gradualmente. Antes, ocorre de forma
abrupta, como resultado da sinergia das perturbações antropogênicas e naturais.
** A
biodiversidade funciona como mecanismo de redundância que atrasa o colapso dos
ecossistemas marinhos.
Microbialização da costa oceânica ao redor do globo
** Sobrepesca
↔ Multiplicação dos microorganismos responsáveis pela eutrofização das
águas dos mares e oceanos.
- Deterioração das algas in situ >> Eutrofização.
- Proliferação de algas venenosas.
- Doenças em espécies marinhas.
- Ameaças à saúde humana (exemplo: cólera).
** Chesapeake
Bay, Mar Báltico, Mar Adriático.
** Diante
da falta de perspectiva histórica, os planos de recuperação de áreas degradadas
têm sido elaborados considerando que as principais causas da proliferação de
micro-organismos nos ecossistemas marinhos deriva do carreamento de nutrientes,
da poluição ou do aquecimento global, não da sobrepesca.
** Como
fruto da perspectiva histórica, descobriu-se que é possível restaurar os
ecossistemas marinhos degradados, mediante manejo faunístico.
- Experimentos em Pamlico Sound demonstraram que até mesmo a restauração parcial da população de ostras é capaz de reduzir significativamente a eutrofização das águas costeiras.
In summary, historical documentation
of the long-term effects of fishing provides a heretofore-missing perspective
for successful management and restoration of coastal marine ecosystems. Previous
attempts have failed because they have focused only on the most recent symptoms
of the problem rather than on their deep historical causes. Contrary to
romantic notions of the oceans as the “last frontier” and of the supposedly
superior ecological wisdom of non-Western and precolonial societies, our
analysis demonstrates that overfishing fundamentally altered coastal marine
ecosystems during each of the cultural periods we examined. Changes in
ecosystem structure and function occurred as early as the late aboriginal and
early colonial stages, although these pale in comparison with subsequent
events. Human impacts are also accelerating in their magnitude, rates of
change, and in the diversity of processes responsible for changes over time.
Early changes increased the sensitivity of coastal marine ecosystems to
subsequent disturbance and thus preconditioned the collapse we are witnessing. P.
293.
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