segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Esquema de Leitura: Direitos Constitucionais Fundamentais, Alves Jr.

Centro Universitário de Brasília – Uniceub
Faculdade de Direito
Pós Graduação Lato Sensu em Direitos Sociais, Ambiental e do Consumidor
Professora Lilian Rose Rocha
Discente: Juliana Capra Maia
Ficha de leitura: ALVES JR., Luís Carlos Martins. Direitos Constitucionais Fundamentais: Vida, Liberdade, Igualdade e Dignidade. Editora Mandamentos, Belo Horizonte/MG, 2010.


·      Os direitos fundamentais visam à emancipação e à dignificação da pessoa humana. Foi a partir dessa ideia que foram concebidos e é assim que devem ser lidos e compreendidos.
 

CAPÍTULO 01: O direito fundamental do feto anencefálico – uma análise do processo e julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54.
·      ADPF 54. Objeto >>> Desautorizar a persecução criminal (Artigos 124, 126 e 128 do CPB) no caso de aborto de fetos anencefálico.
·      Aborto de feto anencefálico >>> Antecipação terapêutica do parto. Vida extrauterina inviável. Ampliação das excludentes de ilicitude do Artigo 128, I (aborto necessário) e II (aborto moral) do CPB.
·      Problema jurídico que envolve choque de interesses fortes (“Trouble Case”). Por um lado, há o interesse da mulher em gerar um feto viável ou de ser mãe de uma criança saudável. Por outro lado, há a defesa dos direitos do feto anencefálico, desprovido de razão e alheio ao embate. Finalmente, há a “defesa do gênero humano em si, independentemente da sua viabilidade, seja na fase intra-uterina, seja fora do útero materno ou em qualquer situação”. Pp. 22.
·      A questão deve sair da esfera religiosa. Não porque a religião seja desprezível para a regulação social, mas porque para se discutir dentro da religião faz-se necessário que todos estejam de acordo com as suas premissas, dogmáticas.
·      A análise jurídica, contudo, também terá um ponto de partida necessariamente dogmático, qual seja, a supremacia dos direitos fundamentais e a defesa radical dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da vida e da liberdade.
 
Petição Inicial da ADPF 54
·      ADPF ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde pelo advogado, hoje Ministro do STF, Luís Roberto Barroso. Relator o Ministro Marco Aurélio Mello.
·      Preceitos fundamentais vulnerados >>> Artigo 1º, IV (dignidade da pessoa humana); Artigo 5º, II (princípio da legalidade, liberdade e autonomia da vontade); Artigo 6º, caput e 196 (direito à saúde), todos eles violados pelo conjunto normativo representado pelos Artigos 124; 126, caput; 128, I e II, todos do Código Penal Brasileiro (Decreto-Lei nº 2.848/1940).
·      Pedido >>> Declaração, conforme à Constituição, dos Artigos 124; 126, caput; 128, I e II do CPB, para que se declare inconstitucional a interpretação de tais dispositivos como impeditivos da antecipação terapêutica do parto em casos de gravidez de feto anencefálico, reconhecendo-se o direito da gestante de se submeter a tal procedimento sem a necessidade de autorização judicial prévia.
·      Principais argumentos:
a)    A interrupção terapêutica do parto de feto anencefálico não é aborto, já que o feto anencefálico não tem sobrevida extrauterina e, dessa forma, não pode ser considerado “nascituro”;
b)    A anencefalia é definida na literatura médica como má formação fetal congênita por defeito do fechamento do tubo neural durante a gestação, de modo que o feto não apresenta os hemisférios cerebrais e o córtex, havendo apenas resíduo do tubo encefálico. Diagnosticada a anencefalia, não há nada que a ciência possa fazer em prol do feto inviável. De fato, não há qualquer tratamento ou possibilidade de reversão do quadro, o que torna a morte inevitável e certa;
c)    Em linguagem vulgar, a anencefalia é a “ausência de cérebro”, anomalia que importa na inexistência de todas as funções superiores do sistema nervoso central: consciência, cognição, vida racional, comunicação, afetividade e emotividade. A patologia permite algumas funções inferiores, que controlam a respiração, as funções vasomotoras e a medula espinhal;
d)    Embora haja relatos esparsos de fetos que viveram alguns dias fora do útero, o prognóstico nesses casos é de sobrevida de, no máximo, algumas horas após o parto;
e)    Aproximadamente 65% dos fetos anencefálicos morrem durante a gestação;
f)     Se nada pode ser feito em relação ao feto, o mesmo não pode ser dito em relação à gestante, de modo a reduzir os seus riscos à saúde e os danos emocionais provocados pela gestação;
g)    Aborto equivale a interrupção da gravidez com morte do feto;
h)   O legislador de 1940 não tinha à sua disposição tecnologia suficiente para diagnosticar fetos anencefálicos. Por isso, a anencefalia não figurou como hipótese excludente de ilicitude;
i)     O anacronismo da legislação penal não pode obstar o exercício dos direitos fundamentais consagrados na Constituição Federal;
j)      Proteger o feto pela criminalização do aborto tem a finalidade de resguardar a possibilidade de o feto viável nascer com vida. Sem a viabilidade da vida extrauterina, não há que se falar em crime de aborto;
k)    Impedir a antecipação terapêutica do parto de feto anencefálico: (k.1) atenta contra a dignidade da pessoa humana da gestante; (k.2) fere a autonomia da vontade da mulher, haja vista a inexistência de proibição de norma proibitiva; (k.3) importa em indevida e injustificável restrição ao direito de saúde da mulher, até porque saúde é o completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doenças; (k.4) equivale a tortura, já que impõe à mulher intenso sentimento físico e mental intencional e evitável;
 
Decisão do Ministro Marco Aurélio
·      Deferimento de liminar na ADPF, autorizando a interrupção da gravidez de fetos anencefálicos. Ante a estrutura da Justiça Brasileira, dificilmente uma matéria originada na primeira instância chegaria ao STF antes de 9 meses.
·      Precedente similar >>> HC 84.025, Relator o Ministro Joaquim Barbosa.
 
Manifestação da CNBB
·      Amicus curiae. Requerimento da revogação da medida liminar deferida ad cautelam;
·      Entre o mal estar da gestante e a dignidade humana do feto, a CNBB fica ao lado do feto;
·      Feto anencefálico >>> Ser humano, possuidor do legítimo direito de viver no útero da mãe até o esgotamento natural das suas possibilidades.
·      Memorial em que se formularam questões de natureza ética, tais como:
a)    O feto anencefálico é um ser humano ou uma “coisa”? Dizem que é um não-ser vivo. Que vem a ser um não-ser vivo?
b)    O feto anencefálico é uma patologia ou a anencefalia é uma patologia? O doente se confunde com a doença? O anômalo com a anomalia?
c)    A humanidade reside apenas na racionalidade? Apenas seres racionais são humanos?
d)    Só o nascituro com viabilidade extrauterina é protegido pelo Direito Brasileiro? Somente seres viáveis devem ser protegidos?
e)    O bem-estar da gestante é superior em relevância à dignidade do feto anencefálico?
f)     Uma gravidez pode ser comparada à tortura ou a tratamentos degradantes porque a criança não atende às expectativas dos pais?
g)    A vida só deve ser protegida se for útil? Quem são os úteis?
h)   O feto anencefálico não tem direito a morrer naturalmente?
 
Parecer do Procurador-Geral da República
·      Cláudio Fonteles. Pugnou pelo indeferimento da ADPF.
·      A intepretação conforme não pode ser utilizada para que o Judiciário inove no Ordenamento Jurídico, agindo como verdadeiro legislador positivo;
·      As excludentes de ilicitude do crime de aborto, que não podem ser interpretadas extensivamente, estão expressamente previstas no Código Penal Brasileiro e nenhuma delas inclui o aborto de fetos anencefálicos:
a)    Para que a gestante não morra (aborto terapêutico);
b)    Se a mãe, vítima de estupro, consente com o aborto (aborto sentimental);
·      A Constituição Federal contempla a inviolabilidade do direito à vida, direito que seria violado no caso da interrupção da gravidez do feto anencefálico;
·      Há vida desde a concepção;
·      O direito à vida é atemporal, isto é, não se mede pelo tempo: é indiferente que haja vida por um minuto ou por cem anos;

Parecer de José Néri da Silveira
·      Parecer em resposta à solicitação formulada pela União dos Juristas Católicos do Brasil
·      De acordo com o entendimento do ministro aposentado:
a)    A ADPF 54 não reúne condições de ser conhecida;
b)    Desde a concepção, há vida humana. O feto adquire personalidade jurídica no momento em que nasce com vida, pouco importando se a ciência lhe previr 01 segundo ou 01 século de vida;
c)    Todos os seres humanos em vida intrauterina são protegidos pelo Ordenamento Jurídico: é indiferente que sejam viáveis ou não, saudáveis ou não. Assim, os fetos anencefálicos também são protegidos pelo Direito;
d)    Interromper a gravidez de feto anencefálico constitui crime de aborto tipificado no Código Penal;
e)    A gravidez de feto anencefálico não implica risco de morte ou depreciação da saúde da gestante. Igualmente, não diminui a dignidade da gestante;
f)     Autorizar o aborto de fetos anencefálicos atenta, sim, contra o direito à vida.
 
Decisão cautelar do Pleno do STF
·      Revogação da autorização do aborto de fetos anencefálicos e, paralelamente, suspensão dos processos penais com o mesmo objeto, até decisão final do STF.
·      Por maioria, o STF decidiu que a ADPF merecia ser conhecida.
 
ADPF na jurisdição constitucional brasileira
·      A ADPF é uma ação do controle concentrado de constitucionalidade, subsidiária da ADI e da ADC, em face de normas ou atos do Poder Público federal, estadual, municipal ou distrital anteriores à edição da Constituição Federal de 1988.
Controle difuso de constitucionalidade >>> Experiência judicial norte-americana. Qualquer magistrado pode averiguar se os atos, normas ou omissões estão de acordo com os mandamentos constitucionais. Situações concretas. A causa de pedir (não o pedido) é a decretação da inconstitucionalidade de determinado dispositivo. Sujeitos processuais determinados ou determináveis.

Controle concentrado de constitucionalidade >>> Experiência judicial austríaca. O cotejo analítico entre a Constituição Federal e as normas, atos ou omissões infraconstitucionais é privilégio de um único órgão jurisdicional. Análise da norma in abstracto. Causa de pedir se confunde com o pedido. Sujeitos processuais indetermináveis.
 
·      Legitimados da ADPF >>> os mesmos da ADI;
·      Ações de controle concentrado de constitucionalidade >>>
a)    Ação Direta de Inconstitucionalidade Genérica – ADI, Arts. 102, I, “a” e 103;
b)    Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADC, Arts. 102, I, “a” e 103;
c)    Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão – ADI Omissão, Art. 103, §2º;
d)    Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva – ADI Interventiva, Art. 36, III;
e)    Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF (Art. 102, §1º).
 
Os direitos fundamentais nos paradigmas constitucionais adequados
·      Paradigma >>> Thomas Kuhn. Realizações científicas universalmente conhecidas e reconhecidas que fornecem problemas e soluções durante certo tempo para certa comunidade científica.
·      Paradigma pré-moderno X Paradigma moderno.
·      No paradigma pré-moderno do direito, há indistinção entre direito, moral, costumes, religiosidade e tradições. Não existe a noção de direitos fundamentais como um núcleo de proteção ao indivíduo (pessoa). O ser humano tinha que cumprir o seu destino e ser útil à coletividade.
·      No paradigma moderno, há separação entre moral, costumes, religião e direito. Marco: Revolução Francesa. O homem moderno faz o seu próprio destino e é tomado como um fim em si mesmo, o grande fim da coletividade. A modernidade passou pelo paradigma liberal, pelo paradigma social e pelo paradigma democrático. 
a)    Paradigma moderno / Liberal >>> Liberdade é pedra angular. Império da autonomia da vontade. Redução da intervenção do Estado na vida particular. Segundo o Autor, nesse paradigma, à mulher cabia escolher se abortaria ou não, vez que sua vontade é soberana sobre o seu corpo.
b)    Paradigma moderno / Social >>> Igualdade. Em nome da igualdade material, a igualdade formal sofre restrições. O Estado passa a ser chamado a intervir, não apenas no cumprimento dos contratos e manutenção da ordem pública, mas na vida particular e social das pessoas. Abortar ou não depende do interesse do Estado. A vida do feto, tanto quanto a vida da mulher, se justificariam à medida que fossem úteis para o Estado.  
          No quadro do paradigma social, o Estado, por meio de um Direito intervencionista, avoca tarefas que eram próprias dos indivíduos e da própria sociedade. O Estado se envolve nas relações de trabalho, nas relações econômicas, passa a intervir na propriedade, aumenta o quadro de serviços públicos, como saúde, educação, cultura, intervém, inclusive, nas relações familiares. No paradigma social, a liberdade do indivíduo e a autonomia de sua vontade sofrem redução em nome do interesse estatal, confundido com o interesse da própria sociedade ou público. PP. 55.
 
c)    Paradigma moderno / Democrático >>> Fraternidade. O indivíduo, dotado de dignidade intrínseca, é corresponsável por si e pela comunidade que o cerca. Respeito à pluralidade e à diversidade. Indivíduo portador de direitos e de obrigações. Reconhecimento de que o Estado, sozinho, não é suficiente para garantir a boa convivência de todos os cidadãos. A questão do aborto torna-se mais complexa, dado que existem choques de interesses legítimos. De um lado, a mulher tem legítimo direito de ter autonomia sobre o seu corpo; de outro lado, a coletividade tem o legítimo direito de resguardar a integridade de todos os seus membros: nascidos ou não, viáveis ou não.

·      Alguns Estados Democráticos têm adotado uma solução conciliatória permitindo, por exemplo, a interrupção da gravidez até a 14ª semana de gestação. Entendem que, ausente o cérebro, o feto é desprovido de sentimentos e emoções e, portanto, ainda não possuiria o diferencial da espécie humana.
·      Engravidar é um ato de vontade da gestante ou, pelo menos, um ato derivado da assunção de um risco.
·      O feto não pertence à mãe, até porque pessoas não podem ser apropriadas.
 
Direitos fundamentais na Constituição Brasileira
·      Pedra angular e inaugural de um novo Ordenamento Jurídico.
·      Vasto catálogo de direitos fundamentais.
·      A partir da própria Constituição, os direitos fundamentais podem ser classificados em: direitos individuais, direitos coletivos, direitos liberais, direitos sociais e direitos democráticos.
a)    Direitos Individuais >>> Podem ser exercidos pela pessoa de forma autônoma. Exemplo: liberdade de crença ou de descrença.
b)    Direitos Coletivos >>> Somente podem ser exercidos por pelo menos mais de uma pessoa, por um grupo. É indispensável o concurso de pessoas. Exemplo: Liberdade associativa.
c)    Direitos Liberais >>> Reduzem ou excluem a intervenção do Poder Público na vida das pessoas. Direito de negação da intrusão do Estado na vida dos indivíduos. Exemplo: direito à intimidade e à vida privada.
d)   Direitos Sociais >>> Dependem da atuação do Poder Público ou exigem prestações positivas do Estado para a efetivação e exercício desses direitos. Exemplo: educação e saúde públicas.
e)    Direitos Democráticos >>> Dizem respeito à atuação participativa do cidadão na vida da comunidade, permitindo-lhe a defesa dos próprios interesses ou dos interesses públicos ou coletivos. Exemplo: meio ambiente.

·      Para o autor, existem dois tipos de direitos fundamentais:
a)    Direitos fundamentais substanciais >>> Vida e Liberdade. “As pessoas são vivas e livres”.
b)    Direitos fundamentais de tratamento ou formalmente fundamentais >>> Dignidade e Igualdade. “As pessoas são tratadas com dignidade e igualdade”.  
·      A Constituição Federal escolheu proteger a dignidade de todos, inclusive dos mais necessitados: crianças, idosos, deficientes, nascituros. 

Assim posto, nada obstante o legítimo interesse da mulher em gestar um filho saudável e viável, se se considerar que esse feto possui vida, independentemente de sua viabilidade ou utilidade, porquanto seja ele o elo mais fraco nessa cadeia sociobiológica, deve ser protegido e garantido o seu direito fundamental de nascer e morrer naturalmente, como todas as demais criaturas humanas.
Todavia, se se partir da premissa de que o feto anencefálico encontra-se no mesmo estágio daquele que é considerado morto, por falência de suas atividades cerebrais, não há porque obrigar a mulher a continuar gestando um ser morto, porquanto não se terá um nascituro, mas sim um natimorto.  Pp. 64.

Insuficiência da proteção criminal ao feto
·      O Direito Penal não tem força suficiente para assegurar que mulheres deixarão de fazer aborto. Mulheres que abortam o fazem porque acreditam que esse era a melhor ou única opção de que dispunham.
·      Tratar o aborto (inclusive do feto anencefálico) com política criminal é um equívoco. Aborto é matéria para médicos e hospitais públicos, não para carcereiros e presídios. 

Prognoses do julgamento de mérito da ADPF 54
·      O julgamento da ADPF 54 tem sido o mais emblemático julgamento da história do STF como Tribunal de Direitos Fundamentais e como Corte Constitucional.
·      O resultado — como todos os outros em Direito — dependerá das premissas adotadas pelos ministros:
a)    Se se entender que o feto anencefálico é um natimorto, não um nascituro, então se concluirá pela possibilidade de interrupção terapêutica da gestação. Aqui, dispensa-se ao feto anencefálico o mesmo tratamento que se dispensa àqueles que têm morte cerebral decretada. Prevalência do direito da gestante de ser poupada de sofrimento e frustração. 
b)    Se se entender que o feto anencefálico é um ser vivo e, como tal, portador de valor intrínseco, e que cabe ao Legislativo (e não ao Judiciário) inserir novas hipóteses de excludente de ilicitude para o crime de aborto, então se concluirá pela impossibilidade de interrupção da gestação.
·      O Direito Penal não tem força suficiente para assegurar que mulheres deixarão de fazer aborto. Mulheres que abortam o fazem porque acreditam que esse era a melhor ou única opção de que dispunham.
  

CAPÍTULO 02: A interpretação constitucional e os direitos dos homossexuais – uma breve análise da ADIN 4.277 e da ADPF 132, sob as luzes da liberdade, da igualdade e da fraternidade.
·      Os conceitos invocados na Constituição Federal são polissêmicos, plurissignificativos.
·      Norma Constitucional X Proposição Constitucional. Enquanto a proposição constitucional é uma das diversas possibilidades de interpretação que podem sem atribuídas ao texto constitucional, a norma constitucional é cogente, vinculante e só pode ser enunciada por quem tem poder de decisão.
·      Quem decide, produz a norma. A norma é fruto de uma decisão, ao fim e ao cabo, de uma decisão judicial. A decisão judicial é um ato de vontade (Kelsen).
·      Texto normativo Norma. A norma surge do texto normativo, mas com ele não se confunde.
·      “O direito não diz nada para ninguém. Quem fala pelo direito é o seu intérprete.” Pp. 78. O direito não é um universo fechado pelo legislador que o postulou. Ele só se completa com a interpretação.
·      Limites para a atuação do intérprete >>>
     (1) Texto legal. Limitação semântica. O intérprete não pode deixar de dizer o que está escrito, ou tampouco dizer o que não está escrito. Ele deve partir do texto para, se for o caso, ir para além do texto. O mesmo se diz acerca dos precedentes jurisprudenciais;
     (2) Harmonia interna do texto, evitando-se contradições internas.
     (3) Bom senso. Prudência.
·      Interpretação do advogado Interpretação do juiz Interpretação do cientista do direito. O cientista do direito deve apresentar todas as interpretações possíveis do texto legal. O juiz e o advogado escolhem uma delas, quer pela sua noção de justiça, quer pelo seu interesse processual.
·      O juiz não é neutro. Mas deve ser imparcial, isto é, deve estar aberto aos argumentos trazidos pelas partes.
·      STF >>> Órgão político.
·      Direitos dos homossexuais >>> Discussão a respeito da qual devem estar alheias as ideologias e convicções religiosas, tanto mais porque, em uma democracia, ninguém pode ser obrigado a acreditar ou a deixar de acreditar.
1)    Dentro das igrejas, sobre os púlpitos, os lideres religiosos podem sim pregar contra práticas que sua religião considera impróprias. Artigo 5º, VI da CF;
2)    Mesmo dentro das igrejas e sobre os púlpitos, os líderes religiosos não podem exigir o apedrejamento da mulher adúltera, a condenação criminal dos homossexuais ou o apedrejamento daqueles que não acreditam em Javé;
 
ADIN 4.277 e ADPF 132
·      APDF 132.
a)    Interpretação do Artigo 1.723 do Código Civil, conforme à Constituição Federal, para que sejam vedadas as interpretações que obstem a união civil entre pessoas do mesmo sexo.
b)    Fundamentos constitucionais >>> Dignidade da pessoa humana (Art. 1º, III da CF); Liberdade, Igualdade, Segurança (Art. 5º, caput); Laicidade Estatal (Art. 5º, VI e VIII e 19, I da CF); Reconhecimento das uniões estáveis (Art. 226, §3º da CF).
c)    Fundamentos encontrados no direito internacional >>> Art. 2º, §1º e Art. 26, ambos do Pacto dos Direitos Civis e Políticos da Organização das Nações Unidas.
d)    Principais argumentos favoráveis >>> (1) Não é possível extrair/atribuir uma vedação às uniões familiares dos homossexuais no texto do Artigo 226, §3º da Constituição Federal; (2) Se é possível reconhecer como “companheiro familiar” o parceiro homossexual para efeitos de inelegibilidade eleitoral (Artigo 14, §7º) ou de nepotismo, também é possível lho reconhecer como “companheiro familiar” para efeitos civis.
e)    Principais argumentos contrários >>> Sob pena de se fomentar a insegurança jurídica, a modificação do texto constitucional deve ser objeto de interferência legislativa, não judicial. O ativismo tem limites.

 
CAPÍTULO 03: As cotas raciais na pós-modernidade – uma breve análise da ADPF 186 e do RE 597.285, sob as luzes do Estado Democrático de Direito.
 
Os paradigmas constitucionais e o princípio da igualdade
·      Políticas afirmativas >>> Meio de concretização material do princípio da igualdade em diversas nações, tais como os Estados Unidos, a Índia e o Canadá.
·      Constituição Federal de 1988 >>> Vértice na Dignidade da Pessoa Humana. Determina a não-discriminação (independente de raça, convicção religiosa, sexo, idade, etc.), a erradicação da pobreza, da miséria e da exclusão social.
·      Dado >>> A população negra, descendente de escravos, é visivelmente mais pobre, menos educada, menos alfabetizada, mais doente, ou seja, tem menos acesso a recursos e oportunidades de vida.

Políticas afirmativas raciais no ensino superior
·      O número de universitários negros é muito inferior ao número de universitários brancos, o que não reflete a proporcionalidade das raças no Brasil. Diante desse dado, algumas universidades (citam-se UnB e UFRGS) criaram cotas para negros, de modo a aumentar a sua participação entre os seus discentes.
·      STF >>> ADPF 186 (ajuizada pelo Partido Democratas) e Recurso Extraordinário 597.285, ambos relatados por Ricardo Lewandowski. Ambas discutem a constitucionalidade do sistema de cotas raciais.
a)    A ADPF 186, ajuizada pelo Partido Democratas, tinha como objetivo ver declarada a inconstitucionalidade de todas as normas que estatuíram cotas raciais para negros e pardos no vestibular da Universidade de Brasília.
b)    O RE 597.285 foi ajuizado por um candidato ao curso de Administração, da UFRGS, que se sentiu injustiçado por ter alcançado maior score no vestibular que seus concorrentes — admitidos na Universidade — negros e estudantes de escolas públicas.
·      O Supremo realizou audiências públicas, com a oitiva de sociólogos, antropólogos, educadores, etc.
 
Argumentos favoráveis às cotas raciais
·      Discriminação positiva ou ação afirmativa. Conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas para combater a desigualdade de gênero, de origem nacional, de raça bem como para corrigir os efeitos das discriminações praticadas no passado.
·      Ações afirmativas buscam induzir transformações culturais, psicológicas, sociais, econômicas, simbólicas, aptas a retirar do imaginário social a idéia de subordinação de uns (hipossuficientes) em relação a outros.
·      Renúncia explícita à pretensa neutralidade do Estado em matéria de oportunidades e de emprego.
·      Princípios constitucionais que subsidiariam a política de cotas raciais >>> igualdade, dignidade, fraternidade, combate às desigualdades sociais, erradicação da pobreza, acesso à educação, busca ao emprego, pluralidade étnica, combate ao racismo, respeito ao mérito e autonomia universitária. Ademais, no texto constitucional existem precedentes de ações afirmativas para outros segmentos sociais, tais como os deficientes físicos.
·      A adoção da política de cotas raciais representa o reconhecimento do Estado no sentido de que, embora não oficial, desde os tempos da escravidão há, sim, discriminação contra os negros.  
 
Argumentos contrários às cotas raciais
·      Não é por causa da cor que os estudantes negros não alcançaram o ensino superior, mas por causa da educação deficiente a que tiveram acesso, a qual, diga-se de passagem, atingem os pobres em geral: brancos, negros, índios ou mestiços.
·      Assim, se a premissa do sistema de cotas raciais é equivocada, isto é, se não é por causa da cor que os cidadãos negros não conseguem alcançar a universidade, mas por causa da sua educação deficiente, então a criação de um mecanismo como as cotas raciais representa uma afronta ao princípio da igualdade.
·      Importação de modelo estrangeiro, inadequado à realidade brasileira. No Brasil, nunca houve o tipo de segregação verificado na Índia ou nos Estados Unidos.
·      O texto constitucional só previu reserva de vagas nos concursos públicos para os portadores de deficiência física. Trata-se de uma exceção ao critério meritocrático que não pode ser interpretada extensivamente.
·      A medida adequada para alcançar os resultados desejados consistiria em investimentos maciços na educação de base, de sorte a preparar todos — inclusive os negros pobres — em condições de competir por uma vaga nas universidades públicas.
·      Cotas raciais seriam simples medidas paliativas que poderiam provocar algo que não existe no Brasil: o ódio inter-racial, ao dividir o país em duas raças (negros e brancos), quando a população se enxerga como multicolorida, mestiça.
·      As cotas raciais estão na contramão da ciência, que já atestou não existirem raças entre os homens.
·      Mesmo nos EUA, a Suprema Corte decidiu pela inconstitucionalidade do critério exclusivamente racial para ingresso nas universidades.

 
CAPÍTULO 04: A interpretação judicial dos direitos fundamentais – em homenagem a Francisco Antônio Paes Landim Filho, mestre no sentido mais estrito do termo.
·      Juiz Imparcial Juiz Neutro. Juiz neutro não existe, assim como não existe direito ou política neutros. O juiz imparcial, por sua vez, é aquele que, mesmo não sendo neutro, está aberto à força das provas e dos argumentos jurídicos. Suas decisões são co-decisões.
·      “A crença na imparcialidade do juiz é essencial para a construção de uma sociedade civilizada” (pp. 142). A crença na imparcialidade do juiz (que garante a paz e a justiça) é também a crença no Judiciário. 
·      E como é construída uma decisão imparcial? Pela análise dos fatos, dos valores sociais e dos enunciados normativos, os magistrados constroem a norma que deverá disciplinar os casos concretos. Veja bem: “constroem”, não apenas “extraem”. 

          Indiscutivelmente, nesse ato de atribuir sentido, o juiz carrega toda a sua visão de mundo: os seus interesses, os seus vícios, as suas virtudes, os seus conceitos e, também, os seus preconceitos, ou seja, a sua experiência de vida e a sua visão do Mundo. O juiz tem seus prismas e paradigmas. O juiz é demasiado humano.
          O juiz não é um ser neutro. Ele tem um passado, ele tem um presente e terá um futuro. Nada obstante, apesar dos pesares, ele deve ser imparcial.
          O juiz imparcial é fiel à sua ciência, consciência e experiência. Mas julga o caso com respeito pelas partes, com rigor no estudo dos fundamentos normativos e com respeito pela sociedade na qual está incerto e da qual ele é seu representante. Pp. 144.  

·      Os textos legais são construídos com conceitos. E os conceitos são plurissignificativos. Conceitos como “igualdade”, “dignidade”, “liberdade” adquirem significados distintos ao longo da história e, em um mesmo momento histórico, em diferentes realidades sociais.
·      As decisões judicias não são rigorosamente objetivas ou rigorosamente subjetivas. Mas devem ser convincentes, principalmente, para as partes derrotadas.  

          A rigor, deveria julgar segundo o Direito. Todavia, o Direito é aquilo que o juiz diz que é na solução das controvérsias ou dos conflitos. Ou seja, em caso de dúvida, o Direito é aquilo que o juiz decide.
          Eis uma situação paradoxal. No regime democrático, o juiz não é senhor absoluto do Direito, mas representante da sociedade, autorizado pelo Estado, na solução de conflitos e que deve aplicar o Direito da sociedade (ou do Estado).
          O juiz não tem legitimidade para impor suas razões subjetivas, mas para decidir segundo o Direito. Todavia, repita-se, esse Direito é o alcançado pelo juiz. É forçosamente um ato subjetivo.
          Nada obstante, essa subjetividade tem limites e controles. O limite são as “palavras” da Lei e os controles são exercidos pelas partes (e procuradores) de sorte que nenhuma decisão é absolutamente subjetiva. Mas também não é rigorosamente objetiva. Pp. 146.

·      Juiz << >> Hércules. Deve julgar com amor, com fé no Direito e na Humanidade. 
 

CAPÍTULO 05: Os paradigmas da pré-modernidade, da modernidade e da pós-modernidade no direito político – uma singela reflexão sobre Alexandre Magno, Napoleão Bonaparte e Barack Obama. 

Introdução
·      O respeito às regras do jogo democrático tem sido uma das características da política norte-americana. Não há registros de “quebras institucionais”. Constituição vigente desde 1787.
·      Oposição livre. Alternância legítima no poder. Liberdade de imprensa. Respeito aos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana.
·      Diferentemente do que ocorre no Brasil (indicação dos candidatos pelos “líderes” partidários), os candidatos à Presidência dos Estados Unidos são eleitos pelos filiados aos seus respectivos partidos.
·      Barack Obama. Advogado e professor de direito. Chances reais de vitória. Fruto da miscigenação, não somente sanguínea, mas cultural. Conviveu com negros, brancos, asiáticos, cristãos, muçulmanos e animistas.  

Alexandre Magno >>> Símbolo da pré-modernidade 

Napoleão Bonaparte >>> Símbolo da mordernidade 

Barack Obama >>> Símbolo da pós-modernidade

·      Pós-modernidade >>> Reino da amplificação das possibilidades.
·      A candidatura de Barack Obama é uma revolução paradigmática na sociedade e na política tradicional.
 
O direito político e os paradigmas jurídicos
·      Direito político >>> Estatuto jurídico do poder político. Ideia moderna, que deriva da separação entre direito, religião, moral, cultura, igreja e política.
·      Política >>> Binômio legitimidade X ilegitimidade (aceitação ou não aceitação das escolhas e decisões pelos destinatários das atividades políticas). Estabelece os fins;
·      Direito >>> Binômio licitude X ilicitude (submissão ou não às normas jurídicas válidas e vigentes). Estabelece os meios.
·      Direito e política visam, mediante previsibilidade e certeza, estabilizar a convivência social. Busca da “paz social” e da “justiça possível”. Mas também podem ser utilizados para perpetuar no poder aqueles que não têm a livre adesão de seus governados (política ilegítima garantida de um poder mascarado).
·      Nos Estados Democráticos de Direito, prevalece a licitude da norma jurídica sobre a legitimidade da decisão política. Nos Estados autoritários, a vontade política atropela os freios jurídicos.

O paradigma da pré-modernidade e Alexandre Magno
·      Greco-Romana.
·      Teocêntrica. Tribo.
·      Pré-modernidade >>> Certezas irracionais, baseadas nas concepções religiosas e nas tradições históricas.
·      Indiferenciação entre moralidade, costumes, direito e religião.
·      Ser humano >>> Não é visto como indivíduo com direitos e deveres recíprocos, mas como membro de uma coletividade sem valor em si mesmo, mas tão-somente enquanto útil para essa mesma coletividade.
·      Na pré-modernidade, a idéia de direitos fundamentais como um núcleo de proteção do ser humano (visto como indivíduo ou como pessoa) é inexistente. As principais garantias das pessoas encontravam-se nas normas de natureza religiosa. Os seres humanos eram considerados objetos à disposição de outros homens ou à disposição das divindades (coisificação do ser humano).  
          Na sociedade pré-moderna, o ser humano tinha de cumprir o seu destino de ser útil à coletividade. E o seu destino estava traçado no momento de seu nascimento, a depender do local ou do núcleo familiar. “Ao nascer, sabia-se como se ia viver e como se iria morrer”. Pp. 158.
 
O paradigma da modernidade e Napoleão Bonaparte
·      Europeia.
·      Antropocêntrica. Nação.
·      Tempo das “certezas racionais” fundadas na ciência.
·      Diferenciação racional entre moral, direito, religião e política.
·      Surgimento da noção de indivíduo: ser indiviso dotado de racionalidade, direitos e deveres. Revolução Francesa. “Todos nascem livres e iguais em direitos e oportunidades” (pp. 159).
·      O homem moderno “faz o próprio destino”, ao passo que o homem pré-moderno apenas cumpria o destino para o qual nascera.
 
          O Direito moderno é o direito da previsibilidade dos riscos e do reconhecimento da imprevisibilidade dos perigos. É o Direito que atua com as “frustrações de expectativas”, mas que não encontra respostas adequadas para os “aborrecimentos” dos perigos inesperados.
          A razão jurídica não se preparou para os perigos imprevisíveis, apenas para os riscos previsíveis. A razão menosprezou as vicissitudes da natureza e da cultura humana. O Estado e o Direito se arvoraram senhores das condutas e comportamentos das pessoas, como se o cumprimento ou descumprimento das leis fosse uma conduta automatizada do ser humano, esquecendo-se dos outros aspectos que envolvem o agir humano (psíquicos, emocionais, morais, éticos, etc.). O homem ficou enjaulado na razão científica. Pp. 160. 

·      Culto à razão iluminista e desprezo aos outros elementos na composição da sociedade e do ser humano, especialmente os psíquico-emocionais e os religiosos (“irracionais”).
·      Apostou todas as suas fichas em um direito organizador e sistematizador da vida humana, garantido pelo poder coercitivo do Estado, reduzindo o papel da sociedade, da família e das confissões religiosas no comportamento humano.
·      Esse direito não foi suficiente para garantir a paz social.
 
O paradigma da pós-modernidade e Barack Obama
·      Norte-americana.
·      Ecocêntrica. Mundo.
·      “Incertezas racionais”. Ceticismo em relação à força da ciência e das verdades universais.
·      Nasceu com o ataque às Torres Gêmeas, em 11/09/2001.
·      Era das mulheres, senhoras das possibilidades e das diferenciações.
·      Desnudou a insuficiência da razão e do direito estatal coerente e sistematizador para a organização humana.
·      Modificação das famílias. Famílias fundadas no afeto. A criação dos filhos passou a representar, também, sucesso aos pais, não apenas às mães. Morte da figura do “pai provedor”.
·      Rompimento das fronteiras nacionais. Novos significados e contornos ao conceito de soberania estatal.
·      Homem pós-moderno >>> Homem do mundo. Pessoa culturalmente miscigenada.

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