quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Resumo de Sentença: Corte Interamericana de Direitos Humanos, Comunidade indígena Yakye Axa versus Paraguai

Centro Universitário de Brasília – Uniceub
Pós Graduação Lato Sensu em Direitos Sociais, Direito Ambiental e do Consumidor
Direitos Humanos
Professora Lilian Rose Rocha
Aluna: Juliana Capra Maia
Caso: Comunidade indígena Yakye Axa versus Paraguai
Síntese da Sentença



Denúncia

 
— 17/03/2003. Comissão Interamericana de Direitos Humanos. 


— Violação dos Artigos 4 (Direito à Vida); 8 (Garantias Judiciais); 21 (Direito à Propriedade Privada) e Artigo 25 (Proteção Judicial), todos da Convenção Americana em relação às obrigações estabelecidas nos Artigos 1.1 (obrigação de respeitar os direitos) e 2 (dever de adotar as disposições de direito interno) em prejuízo da comunidade indígena Yakye Axa del Pueblo Enxet-Lengua.

— O Paraguai não estaria garantindo o direito de propriedade ancestral sobre as terras indígenas da comunidade em questão. O pedido de reconhecimento data de 1993, sem qualquer resultado satisfatório.
— A falta de acesso às terras tem provocado vulnerabilidade alimentícia, médica e sanitária que ameaçam continuamente a sobrevivência dos membros da comunidade.

— Antes de apresentar a denúncia, a Comissão recomendou:
1.      Adotar com brevidade as medidas necessárias para fazer efetivo o direito de propriedade e posse das terras ancestrais da comunidade indígena Yakye Axa do Povo de Língua Enxet: delimitar, demarcar e titular suas terras, de acordo com seu direito costumeiro, valores, usos e costumes. 
2.      Garantir aos membros da comunidade o exercício de suas atividades tradicionais de subsistência. 
3.      Adotar as medidas necessárias para que termine o estado de emergência alimentícia, médica e sanitária da comunidade. 
4.      Zelar pela integridade do hábitat reclamado pela Comunidade enquanto está pendente a titulação do território em favor da comunidade indígena.
5.      Estabelecer recurso judicial eficaz que tutele o direito dos povos indígenas do Paraguai a reivindicar os seus territórios tradicionais. 
6.      Reparar tanto em âmbito individual quanto em âmbito comunitário as consequências da violação dos direitos enunciados. 
7.      Adotar as medidas necessárias para evitar que no futuro se produzam acontecimentos similares, conforme o dever de prevenção e garantia dos direitos fundamentais reconhecidos na Convenção Americana.

— As medidas recomendadas não foram observadas pelo Paraguai, o que levou à denúncia na Corte Interamericana.






Competência da Corte
 
— Paraguai é Estado Parte da Convenção desde 24/08/1989. Reconheceu a competência contenciosa da Corte em 26/03/1993.
 



Aspectos gerais do caso

 
— Caso emblemático no Paraguai.
 
— Uma entre várias comunidades indígenas do Paraguai cujas terras foram adquiridas por particulares.
 
— Comunidades indígenas >>> Nomadismo. Após a morte de um parente, eles deixam o lugar em que moravam.
 
— A Constituição do Paraguai, de 1992, reconhece o Estado como Democrático e Pluricultural. Reconhece sua ascendência indígena.
 
— O Artigo 64 da Constituição Nacional consagra o direito das comunidades indígenas à propriedade comunal das terras que ocupavam tradicionalmente.
 
— O procedimento de regularização de terras indígenas teve sucesso nos casos em que os posseiros e atuais proprietários concordaram em negociar a transferência dos imóveis reivindicados. Fracassaram completamente nos casos em que os proprietários e posseiros se mostraram intransigentes. Argumento: a exploração racional da terra. Noutras palavras, direito indígena no Paraguai carece de efetividade.
 
— Terras tradicionalmente ocupadas pelos Yakye Axa estão sob a propriedade da empresa pecuária LOMA VERDE S.A., pertencente à família Dominguez Dibb. Não lhes é permitido caçar, pegar lenha ou água dessas terras.
 
— Depois da Guerra do Paraguai, apenas indígenas ocupavam o Chaco. As terras foram vendidas em grandes glebas (na Bolsa de Valores de Londres), ignorando as ocupações indígenas anteriores. Os indígenas passaram a viver e trabalhar nas fazendas como empregados.  
 
— Antes, durante e depois do processo os Yakye Axa foram ameaçados.
 
Os Yakye Axa vivem perigosamente em um acampamento às margens da rodovia, nos limites do que antes eram as suas terras. A área que ocupam é tratada como caminho público, motivo que os impede de cultivar. O acampamento, abandonado pelas autoridades paraguaias, situa-se a 356 km da capital e a 70 km do hospital mais próximo.
 
— Nas terras da empresa pecuária LOMA VERDE S.A situa-se o cemitério Yakye Axa, que recebeu o corpo de seus antepassados e onde os membros da comunidade deveriam ser enterrados.
 
— Já ofereceram outras terras aos Yakye Axa, até maiores que as suas originais. Mas como sobre elas incidiam direitos de outros grupos indígenas, preferiram não aceitar.
 
— Por que saíram de lá? 


·    Na fazenda Loma Verde havia trabalho escravo e exploração sexual de mulheres.

·  Narra um informante que, em 1979, caminhonetes os levaram a uma missão anglicana, onde seus ritos não eram bem-vindos. Essa missão anglicana, com mais de 3.000 indígenas e 25.000 hectares, visava à aquisição de terras para assentamentos indígenas com a provisão de apoio sanitário, agrícola e educacional.
·   A Missão Anglicana era moradia do povo Makxlawaya. Por isso, os Yakye Axa não podiam exercer os seus costumes. Guardadas as devidas proporções, caso similar ao dos Irmãos Villas Boas e os índios Paraná.
— Paraguai entende que não está violando a Convenção, já que tem seguido os trâmites legais internos para a instituição de reserva indígena.




DECISÕES DA CORTE
 
Descumprimento dos direitos consagrados nos Artigos  8.1, 8.2.d, 8.2.e, 8.2.f e 25 da Convenção Americana c/c os Artigos 1.1 e 2.




a)      Existe um procedimento adequado para o reconhecimento das terras indígenas?

-- A INDI demorou 03 anos e 01 mês para reconhecer os líderes incontestes da comunidade. Prazo irrazoável.
 
-- A INDI demorou mais 03 anos e 06 meses para reconhecer a personalidade jurídica da comunidade. Prazo irrazoável.
 
-- A demora, em si mesma, constitui aqui uma violação a direitos. Quando o caso é complexo, há justificativa para a morosidade. Mas o caso dos Yakye Axa não é complexo. Só tem se arrastado pela morosidade sistemática das autoridades públicas.
 
-- Os procedimentos paraguaios de demarcação de terras indígenas preveem que o IBR (similar ao Incra) e o INDI (similar à Funai) disporem de terras públicas, expropriarem terras improdutivas ou negociar com proprietários particulares a entrega das terras tradicionais às comunidades indígenas. Mas quando os proprietários se negam a entrega-las, os membros das comunidades indígenas não tem recursos administrativos efetivos que lhes permita reclamá-las.

A Corte considerou os procedimentos paraguaios de delimitação de reservas indígenas, especialmente no caso Yakye Axa, inúteis. Noutras palavras, o Estado deixou de adequar seu direito interno às disposições da Convenção. 



b)     Acesso à justiça.

-- Processo penal viciado. Só receberam assistência de um advogado mais de 2 anos depois que ele começou. Após o advogado ser aceito como patrono dos índios acusados de furto e esbulho possessório, o juiz voltou atrás em sua decisão e negou a intervenção do advogado.

-- Expedição de medidas cautelares que proibiam a comunidade de adentrar a estância Loma Verrde; que expropriavam as suas caixas de abelhas e que determinavam a remoção de ocupantes.

-- Proibição da comunidade em nomear testemunhas e contraditar testemunhas.


Descumprimento dos Artigos 1.1 e 2 da Convenção – propriedade.
-- Os Yakye Axa não tinham posse das terras que reivindicavam. Há muitos anos não as habitavam como proprietários. Vários Yakye Axa nasceram em outras localidades.
-- Propriedade comunal X Propriedade privada. A propriedade comunal dos indígenas significa muito mais para eles que para os brancos. Não se trata apenas de um meio de produção, mas de uma condição elementar de sua existência no mundo. Daí, deve-se concluir que prioritariamente, os Estados devem assentar os índios em suas terras originais e indenizar os atuais ocupantes. Se isso não for possível, deverão oferecer terras semelhantes ou melhores para os povos atingidos.
-- No caso em análise, o Estado ofereceu outras glebas aos Yakye Axa, mas não os consultou previamente, o que levou à negativa.
 
Direito à vida


 
-- A negação à demarcação, expropriação e titulação das terras tradicionais tem prejudicado o direito à vida dos Yakye Axa. Miséria extrema. Falta de acesso aos recursos naturais. Falta de acesso a serviços sanitários e à água potável.

-- Acesso à terra >>> água potável, alimentos, prática de medicina tradicional e cura de enfermidades.
 
-- As iniciativas adotadas pelo Paraguai para prover água potável e alimento aos Yakye Axa não têm sido suficientes para reverter a situação de vulnerabilidade.
 
-- Enquanto o conflito fundiário não se resolve, não pode o Paraguai se eximir de amparar os Yakye Axa.




dispositivo

-- A sentença em si mesma é uma reparação.


-- O Paraguai deverá identificar o território tradicional dos Yakye Axa e entregá-lo aos legítimos titulares, gratuitamente, em prazo máximo de 03 anos.

-- Enquanto os Yakye Axa  estiverem sem terras, deverão ser assistidos pelo Paraguai, garantindo-se a sua subsistência.

-- Os Estado criará, em até um ano, um fundo exclusivamente destinado à aquisição de terras a serem entregues aos Yakye Axa.

-- Implantação de programas e de um fundo de desenvolvimento comunitário.

-- Revisão dos procedimentos administrativos e judiciais, de modo que se adequem à Convenção Americana e garantam, efetivamente, os direitos de propriedade das comunidades indígenas.

-- Ato de desagravo, público, em acordo com as vítimas e em prazo de até um ano.
 
-- Publicar a sentença em rádio, diário oficial e jornal de grande circulação. 01 ano.

-- Restituição dos danos materiais e das custas suportadas pela comunidade indígena. US$ 15,000.00.
-- Obs.: Nem todos os itens foram julgados à unanimidade.

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