Universidade de Brasília – UnB
Centro de Desenvolvimento Sustentável – CDS
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Sustentável
Doutorado
Professor José Luiz de Andrade Franco
Aluna: Juliana Capra Maia
Esquema de Leitura: WASHINGTON, H.; TAYLOR, B.; KOPNINA, H., CRYER, P. and PICCOLO, JJ. Why ecocentrism is the key pathway to sustainability. The Ecological Citizen. Vol 1 n. 1, 2017, Y–Z.
ABSTRACT
** Conceitos:
- Ecocentrismo >> É o termo utilizado para designar as ideias que reconhecem valor intrínseco em todas as formas de vida e nos próprios ecossistemas, inclusive com seus componentes abióticos.
- Antropocentrismo >> Nêmesis do ecocentrismo. Estabelece valores para outras formas de vida e para os ecossistemas conforme sua utilidade para o bem-estar humano, suas preferências e seus interesses.
** Principais aspectos trabalhados no artigo: discussão a respeito das raízes do ecocentrismo, bem como o seu reconhecimento internacional. Refutação da acusação de misantropia. Discussão de como o antropocentrismo não é suficiente para proteger adequadamente o Planeta Terra e os seus habitantes. Em conclusão, os autores defendem que o ecocentrismo é essencial – ética, evolucionária, espiritual e ecologicamente – para solucionar a crise ambiental que atravessamos. Desse modo, a transformação ética em favor do ecocentrismo não é apenas um imperativo ético, mas também um imperativo prático. Por isso, seria necessário apoiar os argumentos e as práticas ecocêntricas.
INTRODUÇÃO
“Ecocentrism finds inherent (intrinsic) value in all of nature. It takes a much wider view of the world than does anthropocentrism, which sees individual humans and the human species as more valuable than all other organisms”. P. Y.
** O ecocentrismo vai além do zoocentrismo e do biocentrismo. Enquanto o zoocentrismo atribui valor intrínseco aos animais e o biocentrismo atribui valor intrínseco à vida, o ecocentrismo atribui valor intrínseco inclusive a seres não-vivos e a processos ecológicos.
RAÍZES HISTÓRICAS DO ECOCENTRISMO
** O ecocentrismo não é novidade. Ele remonta às nossas primeiras intepretações sobre a natureza, que foram interpretações mágicas.
- Essa abordagem já foi chamada de “velha sustentabilidade” (old sustainability) e foi ressuscitada por Aldo Leopold, que defendeu a adoção de uma “Ética da Terra”.
- Mais tarde, pensando no mesmo tipo de problema, Arne Naess cunhou o termo “Deep Ecology” (Ecologia Profunda). O valor intrínseco da natureza consta como o primeiro princípio dessa vertente filosófica que também é uma plataforma política.
** A solução para a crise ecológica é o ecocentrismo. A grande metáfora não deve ser o homem ou o indivíduo, mas a Terra como grande organismo vivo.
RECONHECIMENTO DO VALOR INTRÍNSECO DA NATUREZA NA POLÍTICA INTERNACIONAL
Tanto a Declaração de Estocolmo (ONU, 1972), quanto a Estratégia de Conservação Global (IUCN, 1980) constituem documentos pautados no antropocentrismo ético. Enfatizam a necessidade de adotar um uso sábio dos recursos naturais, de modo que tais recursos não venham a se extinguir, prejudicando a sobrevivência ou a qualidade de vida das futuras gerações de seres humanos.
O documento World Charter for Nature (ONU, 1982), por sua vez, enuncia princípios claramente ecocêntricos, estipulando, inclusive, que humanos e cultura são partes da natureza.
O documento “Nosso futuro comum”, de 1987, abraça princípios ecocêntricos e reconhece o valor intrínseco da natureza. Contudo, na Declaração de Tóquio, que o acompanha, torna a tratar da natureza como fonte de “recursos” para o desenvolvimento econômico, a interesse dos seres humanos.
A Declaração do Rio, de 1992, enuncia em seu primeiro princípio que “os seres humanos são o centro das preocupações do desenvolvimento sustentável”, abraçando uma perspectiva claramente antropocêntrica.
A Carta da Terra, concluída em 2000, avança na adoção de perspectivas ecocêntricas, de reconhecimento de valor intrínseco à natureza. Humanidade e natureza são tratadas como uma totalidade para a qual clama-se justiça. O documento não foi endossado pela Declaração de Johannesburg. Da mesma forma, o documento da Rio + 20 não endossou o reconhecimento de valor intrínseco à natureza, embora tenha mencionado que há países (os autores citam o Equador e a Bolívia) que atribuem direitos à Mãe Terra.
Vê-se, pois, que apesar do apoio obtido pelas abordagens ecocêntricas, ainda prevalece o antropocentrismo ético como consenso dos governos o que, aliás, reflete o antropocentrismo ético das tradições culturais e religiosas.
Necessidade de os acadêmicos se manifestarem expressamente em prol do ecocentrismo.
VALOR INTRÍNSECO INDEPENDENTE DE QUALQUER VALORAÇÃO HUMANA
A natureza e a vida na Terra possuem valor intrínseco, isto é, são inerentemente boas, independentemente do juízo que delas fazem os humanos. Fruto do longo processo evolutivo, os processos naturais criaram certa integridade.
O valor da natureza e da vida não são criados pelos seres humanos e por suas culturas, mas apenas descobertos por eles. Defensor: Holmes Rolston.
O ECOCENTRISMO É MISANTROPO?
O Ecocentrismo não defende que todos os seres tenham valor de existência igual. Também não nega a existência de uma miríade de problemas associados às aglomerações humanas. O Ecocentrismo trata a Ecosfera como um ser que transcende em importância qualquer uma das espécies que a habitam, ainda que essa espécie seja o homem. Os ecocêntricos defendem uma justiça entre humanos, mas também defendem uma justiça entre espécies (ecojustiça).
FORÇA DO ANTROPOCENTRISMO ÉTICO NA ACADEMIA
O Antropocentrismo
ético é dominante entre as maiores sociedades, as maiores religiões, as mais
difundidas culturas. Por isso, não surpreende que também seja dominante na
academia. Constituem abordagens antropocêntricas comuns a respeito da sustentabilidade:
POR QUE O ECOCENTRISMO É A SOLUÇÃO?
O Ecocentrismo, com o reconhecimento das obrigações humanas para com a natureza, seria essencial para a solução da grave crise ambiental atualmente enfrentada.
O PAPEL DA CIÊNCIA
A ciência ocidental, em especial pela compreensão e elucidação do processo de evolução das espécies, corrobora a ética ecocêntrica. O evolucionismo nos mostra a nossa herança e a nossa dependência em relação à natureza, além de demonstrar a complexa interconexão entre todos os seres vivos. Desse modo, a visão científica é muito próxima daquela adotada por sociedades indígenas, para as quais o homem era parte de um mundo sagrado.
CONCLUSÕES
Uma ética ecocêntrica derivaria naturalmente do nosso processo evolutivo, das nossas capacidades empáticas e estéticas que, combinadas com nossas habilidades racionais, nos permitiram aumentar o nosso conhecimento a respeito de nós mesmos e do mundo [Afirmação ousada].
Esse processo nos permitiu perceber que nós somos parte da natureza, que estamos mergulhados em um fascinante mundo vivo: o único lugar do universo em que realmente sabemos existir vida. Se algo merece respeito ou mesmo reverência é a vida no nosso próprio planeta-lar.
Os autores sustentam que uma transformação por meio de uma ética ecocêntrica é o caminho necessário para o florescimento da vida na Terra, inclusive da vida da nossa própria espécie.
- Serviços ecossistêmicos. “Serviço ecossistêmicos”, por definição, constituem “benefícios que as pessoas obtêm dos ecossistemas”. Em outros termos, os serviços prestados pelos ecossistemas são considerados apenas no que são úteis a Humanidade. Ocorre que a natureza fornece serviços a todas as espécies, serviços esses que devem ser preservados.
- Sustentabilidade forte. Oposta à "sustentabilidade fraca". A partir da abordagem da sustentabilidade fraca, seria possível destruir áreas naturais e reduzir a biodiversidade desde que dinheiro, conhecimento e construções fossem transmitidos às futuras gerações. Os defensores da "sustentabilidade forte" vão adiante e exigem que o estoque de capital natural permaneça constante independentemente do capital construído pelo homem. Trata-se de uma abordagem antropocêntrica por focar somente nos requisitos para a sobrevivência humana.
- Educação para o desenvolvimento sustentável. Promovida pela ONU e pela Unesco. O approach da Unesco e da ONU favorece o industrialismo, que é uma visão inconsistente com uma compreensão holística de sustentabilidade.
- Abordagem da nova conservação. Os defensores da "nova conservação" defendem que o bem estar humano deve estar no centro dos esforços pela conservação. Além disso, eles perseguem o desenvolvimento econômico, a redução da pobreza e a parceria entre corporações como substitutos para os mecanismos atuais da conservação, tais como a constituição de áreas protegidas. Essa abordagem distorceria a ecologia e priorizaria o desenvolvimento capitalista em detrimento da integridade da sociedade e dos ecossistemas.
New conservation is all about human interests,
not nature’s
POR QUE O ECOCENTRISMO É A SOLUÇÃO?
O Ecocentrismo, com o reconhecimento das obrigações humanas para com a natureza, seria essencial para a solução da grave crise ambiental atualmente enfrentada.
- Aspectos éticos. O ecocentrismo expande a comunidade ética ou moral para outros seres que não os humanos. Isso implica respeito por toda forma de vida e mesmo pelos ecossistemas terrestres e aquáticos em si mesmos. O ecocentrismo tem sido um aspecto importante para diversos indivíduos e para muitas culturas ao longo de milênios. Não há justificativa filosófica ou científica para que as preocupações morais não sejam estendidas para toda a ecosfera, com seus componentes bióticos e abióticos.
- Aspectos evolucionários. O ecocentrismo reflete o reconhecimento de que o Homo sapiens evoluiu cercado de uma ecosfera rica em diversidade de vida, o que é um legado de 3.5 bilhões de anos. Em outros termos, o ecocentrismo reconhece que somos parte da natureza, não uma espécie à parte. Isso erode as noções de supremacia humana.
- Aspectos espirituais. Os valores ecocêntricos eram constituintes de diversas religiões. Atualmente, eles vêm sendo progressivamente fundidos às espiritualidades baseadas na natureza e em vários casos, criando credos completamente novos. Visão da Terra e dos seus ecossistemas como sagrados, dignos de reverência e de cuidado.
- Aspectos ecológicos. O ecocentrismo nos lembra que a ecosfera e todas as formas de vida são interdependentes. Também nos lembra que tanto humanos quanto não-humanos são completamente dependentes dos processos ecossistêmicos que a natureza provê. Uma ética antropocêntrica, sozinha, é insuficiente para proteger a biodiversidade. Com a perspectiva ecocêntrica, percebe-se que cada espécie e cada organismo vivo hoje chegou aqui por meio de uma longa e incansável luta pela existência. Além disso, a ecologia nos ensina humildade: nós devemos reconhecer que não sabemos tudo a respeito dos ecossistemas da Terra, o que nos sugere uma aproximação cuidadosa de cada um deles.
O PAPEL DA CIÊNCIA
A ciência ocidental, em especial pela compreensão e elucidação do processo de evolução das espécies, corrobora a ética ecocêntrica. O evolucionismo nos mostra a nossa herança e a nossa dependência em relação à natureza, além de demonstrar a complexa interconexão entre todos os seres vivos. Desse modo, a visão científica é muito próxima daquela adotada por sociedades indígenas, para as quais o homem era parte de um mundo sagrado.
- Reconhecimento dos saberes tradicionais. Aproximação entre saberes tradicionais e ciência. Discussões cross-culturais.
CONCLUSÕES
Uma ética ecocêntrica derivaria naturalmente do nosso processo evolutivo, das nossas capacidades empáticas e estéticas que, combinadas com nossas habilidades racionais, nos permitiram aumentar o nosso conhecimento a respeito de nós mesmos e do mundo [Afirmação ousada].
Esse processo nos permitiu perceber que nós somos parte da natureza, que estamos mergulhados em um fascinante mundo vivo: o único lugar do universo em que realmente sabemos existir vida. Se algo merece respeito ou mesmo reverência é a vida no nosso próprio planeta-lar.
Os autores sustentam que uma transformação por meio de uma ética ecocêntrica é o caminho necessário para o florescimento da vida na Terra, inclusive da vida da nossa própria espécie.
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