segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Esquema de leitura: Of tigers and humans: the question of democratic deliberation and biodiversity conservation, de Kopnina, Helen.

Universidade de Brasília - UnB
Centro de Desenvolvimento Sustentável - CDS
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Sustentável
Doutorado
Professor José Luiz de Andrade Franco
Aluna: Juliana Capra Maia
Esquema de Leitura: KOPNINA, Helen. "Of tigers and humans: the question of democratic deliberation and biodiversity conservation"in WUERTHNER, George; CRIST, Eileen; BUTLER, Tom. Protecting the wild: parks and wilderness, the foundation for conservation. San Francisco: Foundation for Deep Ecology; Washington DC, Island Press; 2015.



** Políticas pró-conservação não estão diretamente relacionadas ao triunfo da democracia. 
  • Criação das áreas protegidas na República Dominicana, por governo autoritário; 
  • Criação das áreas protegidas na África Oriental, mediante editos dos governos coloniais;
  • Proteção da vida selvagem africana mediante autorização para matar caçadores (Richard Leakey);
  • Guerra à caça ilegal e ao contrabando, no Estado Indiano Maharashtra, mediante autorização expressa para atirar em caçadores e traficantes.


** Problema ético: conservar a vida selvagem autoriza violar os direitos fundamentais dos caçadores e traficantes de biodiversidade?


** Por definição, "democracia" é um sistema participativo de tomada de decisões. Mas esse sistema é "participativo" para seres humanos. Seres não-humanos não participam de tais decisões. Como resultado, não há qualquer garantia de que "mais democracia" representará "mais conservação".



Conservação dos tigres

** Ao longo do século XX, cerca de 97% dos tigres que habitavam a Terra foram mortos. Se antes eles rondavam toda a Ásia, atualmente, há cerca de 3.200 indivíduos, confinados em áreas protegidas. Por quê?
  • Caça ilícita de tigres.
  • Sobre-caça das presas dos tigres.
  • Fragmentação de habitats.
  • Mudança climática, afetando um dos habitats do tigre (uma floresta em Bangladesh).


** Casos mais recentes:
  • Na Índia, em 1972 foi lançado um projeto em prol da conservação dos tigres, com o aval da primeira ministra Indira Gandhi. O sucesso do projeto foi eclipsado pelas acusações de que o governo de Gandhi atuou de forma anti-democrática para alcançar os seus intentos (controle de natalidade de populações humanas; obrigatoriedade de remoção de populações humanas para outras áreas).
  • No extremo leste da Rússia tem se verificado o declínio drástico do número de tigres siberianos. O governo de Vladimir Putin -- que é, no mínimo, polêmico em termos de  respeito à democracia -- decidiu lançar um programa para restaurar a população do tigre siberiano e, mais além, decidiu reintroduzir o leopardo persa no sul do território russo, de onde o felino foi extinto na década de 1970.



Eficácia da conservação

Alguns autores dizem que a democracia é inadequada para as políticas conservacionistas, dado que ela mesma é parte do problema. Isso porque as democracias liberais seriam influenciadas por elites motivadas por lucro no curto prazo, o que é incompatível com os desafios da conservação. 

Outros autores alertam que as políticas conservacionistas autoritárias tendem a colapsar. Isso porque o preço de manter grandes áreas inacessíveis à população se tornaria proibitivo. Ademais, permitir à população acessar áreas protegidas legaria às populações locais certo senso de responsabilidade ambiental.

A autora alerta que a participação das comunidades locais nas políticas conservacionistas não garante a sua eficácia. Casos:
  • Mortandade de golfinhos pela população das Ilhas Solomon, por causa de uma disputa com uma organização não governamental. Os ilhéus acusaram a ONG de não lhes ter pago a contrapartida pela preservação dos animais, como combinado. Por sua vez, a ONG arguiu que os líderes da comunidade se apropriaram do dinheiro que deveria ter sido distribuído entre todos. 
  • Comunidades indígenas que têm as suas terras demarcadas para, depois, vender o direito de explorá-las no grande mercado.



Justiça ambiental

** O que é perseguido pelos que lutam por "Justiça ambiental"? 4 grandes eixos:
  • Reequilíbrio dos benefícios ambientais em favor de grupos desfavorecidos;
  • Alerta para a exposição desigual a riscos ambientais: grupos desfavorecidos estão sujeitos a maiores riscos; grupos favorecidos estão sujeitos a menores riscos.
  • Justiça inter-geracional. Que planeta as gerações futuras herdarão?
  • Justiça entre espécies. 


** Conservacionismo > acusado, pela Antropologia, de ser coisa de gente ocidental, branca, de classe média ou de classe alta. Desse modo, seria uma nova forma de colonialismo imposta às sociedades simples. Crítica:
  • Argumentos que desconsideram o igualitarismo biosférico (aumentando a miopia do antropocentrismo ético); 
  • Argumentos que desconsideram os próprios valores ecocêntricos de determinados grupos humanos que supostamente "defendem"; 
  • Argumentos que desconsideram que comunidades tradicionais estão cada vez mais integradas no "mundo ocidental", adotando atitudes de exploração da natureza típicas do "homem branco".
  • Contradição entre "defender os direitos de exploração dos recursos naturais" (lógica mercadológica) e "defender os direitos de preservação dos recursos naturais" (lógica tradicional) pelas sociedades simples.


** Na inexistência de uma ética universal, as avaliações das políticas conservacionistas acabam dependendo de pontos de vista. 

Debate sobre a (in) existência de valor intrínseco de espécies não-humanas. De acordo com uma perspectiva ecológica rasa, o valor da natureza repousa na satisfação das necessidades (físicas, estéticas ou espirituais) dos homens. 

Essa perspectiva deixa de fora a discussão sobre incontáveis espécies e processos ecológicos considerados "inúteis"; deixa de fora a discussão sobre redução e fragmentação drástica de habitats; deixa de fora a discussão sobre as formas cruéis de criar e de abater animais para o consumo humano; sobre experimentos científicos cruéis com animais. 

Ademais, como a população humana pode sobreviver com grandes monoculturas, a existência de grande parte da biodiversidade se torna "redundante".



Democracia e ética

** Em uma democracia, sem a existência de defensores da natureza legalmente reconhecidos, não há garantias de que espécies não-humanas serão consideradas nos processos decisórios. Ao contrário, a tendência é que não o sejam. 

** Nesse contexto, as políticas conservacionistas "top-down" seriam, sim, eticamente justificáveis. A ética não seria exclusivamente aplicável a seres humanos. Se é assim, formas de vida não-humanas consistem uma minoria. Como tal, devem ser protegidas.
"Ecologically enlightened political leadership might be needed to make "unpopular", in the short term, decisions by sacrificing some aspects of democracy on the altar of abating biodiversity loss. If the deep ecological perspective were to be taken seriously, the voice of the "minority" of advocates would actually be recognized as the voice of the majority of biospheric citizens, and the discrimination against the nonhuman species would come to be seen as a case of grave environmental injustice". P. 70. 


Conclusão

No curto prazo, políticas conservacionistas autoritárias tendem a ser mais bem-sucedidas que as políticas democratizantes. No longo prazo, contudo, elas não se sustentam. Então, como agir? 

Para a autora, a democracia só será um regime adequado à conservação se tomar os seres não humanos como sujeitos éticos, cujos interesses podem ser defendidos por eco-advogados (e "eco-lobistas").

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