Universidade
de Brasília – UnB
Centro de Desenvolvimento Sustentável – CDS
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Sustentável
Doutorado
Disciplinas: Fronteira, Recursos Naturais e Conservação da
Natureza.
Professores: José Luiz Franco e José Augusto Drummond
Aluna: Juliana Capra Maia
Esquema de Leitura
Texto:
DA MATTA, Roberto. Em
torno da representação da Natureza no Brasil: Pensamentos, Fantasias e
Divagações. In: BOURG, Dominique (Org.). Os Sentimentos da Natureza. Lisboa:
Instituto Piaget, 1993. Páginas
127-148
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Apesar das grandes diversidades regionais brasileiras, é possível pensar em uma
ideologia, em um conjunto de valores subjacentes, que orientam a relação entre
homem e natureza.
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Dilema brasileiro >>> O
sistema social brasileiro contempla valores modernos, tais como o
individualismo igualitário, o progresso material e o controle da natureza e, ao
mesmo tempo, também contempla valores tradicionais que continuam a comandar as
práticas sociais mais corriqueiras (pp. 128-129).
-- O dilema
brasileiro está na raiz da clivagem entre discursos (individualistas) e
práticas políticas (clientelistas);
**
O dilema brasileiro também pode ser encontrado nas nossas representações
sociais acerca da natureza.
**
O Brasil, tal como outros países de Terceiro Mundo, constitui um fértil campo
de estudos acerca da natureza, dada a diversidade de valores e ideologias
existentes (p. 129).
**
Representações sociais da natureza, no
Brasil >>>
-- Terra
provedora, mãe terra, mãe pródiga, abundante em riquezas e que suporta homens,
vegetais e animais.
-- Quanto mais
pródiga a natureza, pior o povo. A chave do sucesso histórico repousa na
existência de um povo com caráter suficientemente forte para vencer as
dificuldades impostas pela natureza.
-- Puritanos na
América do Norte: ganharam uma terra para domesticar X Portugueses no Brasil:
ganharam uma terra que corresponde a uma visão passiva do Paraíso (visão
edênica).
-- Implícita na
visão edênica sobre a natureza brasileira está, também, a ideia de que essa
natureza é boa para pilhar, isto é, que basta “esticar a mão” para tomar-lhe os frutos, o que implica um contato
superficial. Trata-se do que Da Matta denominou como “Extraccionismo Predador” (p. 134).
-- Essa visão
dominou a história econômica brasileira, marcada por ciclos, cada um dos quais
correspondente à descoberta de uma fonte natural explorada à exaustão: açúcar,
ouro, café e borracha.
A
obsessão pela extracção gera uma lógica relacional ambígua que oscila entre uma
concepção da natureza habitada pelo maravilhoso, local de poderes mágicos, e
uma concepção do mundo natural à mercê do homem. Não sendo percebida como um
domínio compartimentado e independente do homem, a natureza encontra-se ligada
à sociedade por intermédio de seres e de zonas intermediárias. Encontram-se
nesta categoria animais específicos como o boto [...], bem como os animais
domésticos (p. 134 e 135).
-- Imbricação da Natureza
na Cultura e da Cultura na Natureza, o que afasta as representações sociais
brasileiras da fórmula ocidental Natureza versus
Cultura. Sociedade brasileira como holística ou hierárquica (herança
ibérica). Aqui, a Natureza (tal como todo o resto) insere-se em um grande sistema
de relações complementares e desiguais, que englobam o outro mundo, os animais,
as plantas e os humanos.
De tal maneira que, a uma representação da natureza como esfera
passiva e metaforicamente concebida como serva – escrava do homem que dispõe
dela como muito bem entende --, corresponde uma estrutura social que se
fundamenta, do mesmo modo, na passividade obrigatória do trabalhador e na submissão
total ao senhor. Portanto, é impossível compreender o sistema de monocultura
patriarcal característico do Estado então em formação no Brasil, sem referir os
valores de uma sociedade que, até à independência e ao aparecimento dos
movimentos abolicionistas e republicanos, assentava numa pesada hierarquia.
Entre os homens e a natureza estabeleceu-se uma lógica idêntica àquela que
governava os homens entre si: a lógica da desigualdade (p. 140).
-- Entende-se que
o Brasil foi “descoberto”, e não “fundado” >>>
(a) A “descoberta” é um fruto do acaso, da
sorte e, por isso, não demanda a assunção de posições e de valores pelos
sujeitos envolvidos. Continuidade. As instituições humanas ficam isentas de
responsabilidade nos processos históricos de formação da sociedade.
(b) A “fundação”, por sua vez, é um ato de vontade.
Demanda clareza dos valores, normas e procedimentos a serem adotados. Ruptura.
**
Extraccionismo predador >>> Assentado em coletividades masculinas preocupadas com
enriquecimento fácil e com ascensão social no seu país de origem (p. 136).
Colonização do Brasil >>>
--
Portugueses
-- Prevalência
da ética do aventureiro (prosperidade sem esforço, riquezas fáceis, títulos
honoríficos, desejo de posição social), não da ética do trabalhador.
--
Carnaval. Rememora a chegada dos portugueses a uma terra edênica, que poderia
matar a sede e a fome de todos. Inclusão dos “de fora” por meio de prazeres
sensuais, do riso.
|
Vs.
|
Colonização da Nova Inglaterra >>>
-- Puritanos
-- Exclusão
da ideia de passividade do mundo natural.
-- Prevalência
da ética do trabalhador. O Novo Mundo era visto como o fim de uma viagem, e portanto,
eram marginais os desejos de enriquecimento fácil e de obtenção de títulos
honoríficos. A nova terra devia ser domesticada, não simplesmente pilhada ou
explorada.
--
Dia de Ação de Graças. Reforço da união do grupo, em contraposição aos “de
fora” (natureza, índios, etc).
|
** A natureza na
sociedade >>>
-- Tal como o sagrado, a natureza
exerce sua ação dentro e fora da sociedade. Fora da sociedade, a natureza
manifesta sua inesgotável passividade e sua energia ameaçadora. Dentro da sociedade,
a natureza manifesta-se pelas palpitações incontroláveis dos instintos, das
paixões, ligando o homem à sua natureza animal e ao seu lado egoísta.
-- A substituição da representação
antropocêntrica da natureza pelo moderno biocentrismo (nascido com o
ecologismo) representa uma vitória do individualismo igualitário e, portanto, da
clara demarcação entre natureza e cultura.
-- Perspectiva biocêntrica: a
natureza é autônoma, possui direitos (e deveres), não pode ser mutilada, tem
seus limites e fronteiras.
-- Na sociedade hierárquica ou
tradicional, o escravo simboliza o encontro entre natureza e sociedade.
Na sociedade tradicional e hierárquica [...] o escravo simboliza
a junção da natureza com a sociedade. De resto, é por isso que ele, tal como os
animais domésticos, é objeto de castigos e atos de crueldade por parte dos seus
senhores. A maldade e a crueldade para com os inferiores representa uma “segunda
natureza”, que funciona como mecanismo para pôr em ordem ou reafirmar as
fronteiras entre a natureza e a cultura, de uma maneira dramatizada. A
malevolência para com os animais e as plantas – que se exerce ainda nos nossos
dias – surge como um gesto destinado a instituir simbolicamente uma divisão quase
impossível entre os dois campos. Como um ritual exorcista, visando separar as identidades
que o quotidiano tende a fundir. Uma espécie de dramatização da linha de
fronteira, para se afirmar como senhor face a uma natureza que, pretensamente, não
sai da sua passividade generosa. Pergunto-me se este mesmo mecanismo não entrará
também em ação no costume urbano que consiste em cimentar o pátio e, ainda na
prática habitua que consiste em destruir a floresta à custa de incêndios enormes,
muitas vezes incontroláveis. Uma maneira de exorcizar uma natureza considerada
sufocante, extirpando-a da sociedade. P. 141.
-- A presença da natureza na sociedade
põe em perigo as fronteiras entre os englobantes e os englobados.
** Conclusão: Entre o Paraíso
e a visão Ecológica >>>
-- Conciliação,
no Brasil, entre a representação mágica da natureza (em que a natureza e o
outro mundo se unem para formar um domínio ambíguo, denso e parcialmente
desconhecido e que a todo instante se manifesta entre nós) e a representação
moderna da natureza, sem que se perceba as enormes contradições que isso
implica.
-- Continua-se a
acreditar em uma natureza pródiga e em um Brasil paradisíaco, de riqueza e
generosidade inesgotáveis: nossa história terminaria em “milagre”, em um “golpe de
sorte” em que toda a gente se sai bem, sobe na vida e enriquece.
-- Considerando
os traços ibéricos da formação cultural e econômica do Brasil, é de se esperar
que a tradição ecológica encontre dificuldades para se estabelecer.
DISCUSSÃO EM SALA
** No Brasil, não há separação entre cultura e natureza. A
natureza entra na base da pirâmide hierárquica.
** Visão cornucopiana acerca da natureza. “Vamos topar com uma
nova riqueza, a qualquer tempo”.
** Visão mágica sobre o mundo. Estamos sempre “pendurados” na natureza.
**
Catarse è Ritual de inversão. Carnaval.
**
Relação entre Recursos Naturais e Prosperidade >>> Tanto maior a dependência de recursos naturais como fonte de riqueza, tanto menor a prosperidade de um país.
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Os países mais ricos geram riqueza por meio de investimento de ciência e
tecnologia, não em mero beneficiamento de matéria-prima.
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Biodiversidade da Amazônia è
Nova fonte de riqueza? Mais uma manifestação da visão cornucopiana acerca da
natureza?
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Tipo de sociedade em que a culpa é terceirizada: “o imperialismo”, “os
estrangeiros”, “os americanos”, “os portugueses”, “a metrópole”, etc...
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