Universidade de Brasília - UnB
Instituto de Ciências Sociais - ICS
Departamento de Sociologia
Seminários: As consequências do pensamento radical
Prof. Luís Augusto de Gusmão
Aluna: Juliana Capra Maia
Anotações
1º Encontro
- O giro epistemológico do pensamento radical ocorreu nos anos 1920.
- Se, no século XIX, entendia-se que a ideologia era um "erro existencialmente criado" (Marx), no século XX a crítica social também atinge a verdade.
- Lucacks: "o conhecimento objetivo está comprometido com a dominação". Blindagem do marxismo.
- Foucault, Latour, etc.: o próprio conhecimento é mais um discurso e, assim, um instrumento de poder. Argumento baseado em certa interpretação de Nietzche, segundo quem "a verdade não existe", de modo que "a vontade de verdade" equivale à "vontade de poder".
- Problema: Há dois Nietzches. Um iluminista, um anti-iluminista. Um elogia a verdade e a ciência; o outro critica a ciência como forma de criticar a própria modernidade.
Nietzsche
- F. Nietzsche era um iconoclasta. Não possuía "ídolos filosóficos".
- Naturalização da epistemologia.
- Alvo nº 01 de Nietzsche: a Metafísica. Duras críticas ao transcendentalismo. "Eu sou um anti-metafísico".
- Estabelecimento de relação entre o temor e a cognição. Dessacralização da consciênciam, ou seja, da razão.
- Ridicularização dos defensores do "mundo supra-empírico" e da existência do "argumento racional em si mesmo". Recusa a diferenciação entre "a coisa em si" e os "fenômenos".
- Ridicularização dos filósofos da moral. Abordagem sociológica da moralidade.
- Crítica à redução da filosofia à Teoria do Conhecimento.
- Crítica ao Cristianismo. Incapacidade de enxergar a verdade. Apego a ilusões. O Cristianismo derivaria de um "erro intelectual". "Encaro a ética cristã como encaro a Alquimia".
- Causação > Necessidade do intelecto humano. Propensão do intelecto humano a criar padrões para assimilar o mundo.
- Discursos difíceis de digerir:
a) A humanidade é formada apenas pelos indivíduos intelectualmente superiores. Os demais são apenas gado ("plebe ignara").
b) Repulsa à dimensão "plebeia" da ciência. As regras da ciência estão à mão de todos. A falseabilidade ou não das hipóteses científicas não respeitam estamentos.
c) Compromisso com a criação de um sistema, que pode se auto-blindar. Um sistema é um grupo de enunciados proibitivos: quando diz "todo S = P", proíbe, automaticamente, "S = não-P". Chave do sistema de Nietzche: redução do mundo à "vontade de potência".
2º Encontro
- A moderna investigação social é radicalmente distinta do que se fazia antes, com a metafísica. Nisso, Weber, Marx e Durkheim concordam, nisso são uníssonos. Uniformidade metateórica: há uma verdade, calcada nos fatos, não em argumentos transcendentais.
- Na Sociologia Clássica, conhecimento empírico é conhecimento confiável. Não há uma crítica da epistemologia.
- Marx e o marxismo russo (Lênin, Rosa de Luxemburgo) admitiam esse mesmo pressuposto. "Do meu lado estão os fatos".
- O chamado "giro epistemológico" ocorre nos anos 1920, com G. Lukács e Karl Korsh.
- Para G. Lukács, como o marxismo é um "método", não sucumbiria diante de realidades factuais contrárias. Esse posicionamento foi criticado por Karl Popper: Lukács sucumbiu ao dogmatismo, às estratégias de blindagem, à tentativa de imunização do marxismo à crítica. "A exigência de correspondência com os fatos já é resultado da sociedade reificada". Korsh: "Após a derrocada da classe trabalhadora, na França em 1848, o marxismo degenera em ciência positiva".
- Para Marx, o conhecimento objetivo emancipa e a ideologia escraviza. A ideologia é o erro existencialmente criado.
- Após o "Giro Epistemológico" nos anos 1920, conhecimento científico passa a ser tratado pura e simplesmente como "vontade de poder". Onde os defensores desse "giro epistemológico" se baseariam? Em Friedrich Nietzsche.
- Aspectos da filosofia de Nietzsche:
-- O agir moral não deve se fundamentar no transcendentalismo. Naturalização do agir moral. Censura aos moralistas ingleses.
-- O sujeito cognitivo e moral está encarnado. Abordagem naturalista radical, rompendo com a metafísica.
-- Dissolve conceitos morais por meio da ciência. A ciência "dilui" a religião.
-- Há dois Nietzsches. Um empírico, um normativo. O empírico faz diversas reflexões bastante pertinentes à investigação social moderna. O § 191 de Aurora, por exemplo, se encaixa perfeitamente na Teoria da Escolha Racional.
3º Encontro
- Nietzsche opera com conceitos do senso comum. Não depende de um "sistema". Talvez a única testemunha do jargão técnico em Nietzsche seja a expressão "vontade de poder".
- Junto com os "significados técnicos" estão acoplados um sem número de significados. Com o conceito, acolhe-se o "sistema".
- Em uma acepção iluminista, a razão é sinônimo de abertura para a discussão, para a recusa de fanatismo, para o diálogo.
- O livro "Aurora" contém incontáveis passagens do Nietzsche iluminista. Aforismo #6, por exemplo.
Tanto maior a elucidação das causas, tanto menor a influência da moralidade. Tanto mais ciência, tanto menos religião.
- A ciência destrói um sem-número de causalidades fantásticas: mitologias, superstições, dogmas religiosos.
- Elogio à Europa. Viés evolucionista, acompanhando a Antropologia de sua época.
- Aurora e Gaia Ciência (Livros I a IV) = Nietzsche iluminista.
- Genealogia da Moral, Gaia Ciência (Livro V) e Para Além do Bem e do Mal = Nietzsche anti-iluminista.
- A arte, a metafísica e a religião tornam o mundo um lugar agradável, tolerável, interessante, colorido. A verdade, por sua vez, é cinza, árida. Daí a frase: "Quanta verdade suporta um espírito?".
- Em Aurora, Nietzsche associa o homem de ciência ao "espírito livre", ao homem descolado do seu tempo, ao homem capaz de suportar a verdade, ao homem que diz "não" ao rebanho. Em Aurora, o homem de ciência é o herói, o super-homem.
- Em Vigiar e Punir, de Foucault, o homem livre (o espírito livre) é o desviante. Romantização dos marginais. Foucault está em uma cruzada contra o Iluminismo, contra Voltaire. Idolatra o lumpemproletariado, os desviantes. OBS.: Entrevista do Marcola!
- Em Genealogia da Moral, o homem de ciência vira mais um "sacerdote ascético". OBS.: Desconfia-se que o último espírito livre, nessa segunda fase de Nietzsche, seja o próprio Nietzsche!
- Afirmação da individualidade, crítica ao espírito de rebanho, desconfiança em relação à sociabilidade.
4º Encontro
- A formulação de uma Teoria Geral Social implica o estabelecimento de variáveis causais que ultrapassem contextos históricos e culturais. Como é feita? Por meio da abstração dos conceitos, isto é, do esvaziamento dos conceitos.
- Nietzsche critica os grandes sistemas filosóficos / metafísicos, mas acaba por fundar, nos seus últimos livros, uma filosofia sistemática.
- "Hostilidade alemã" ao Iluminismo (#197 de Aurora). Os filósofos alemães deixaram de lado as explicações e se satisfizeram com os conceitos. Alemães críticos da razão e da ciência são classificados como criaturas obtusas, néscias.
- Crítica a determinado tipo de arte, qual seja, aquela que associa o belo ao inteligível. Isso implicaria o gosto pela arte romântica, pelo sublime (única forma de acessar a "verdadeira condição humana"?
- A ciência não é um conjunto de produtos. Ela é um conjunto de métodos. Essa frase poderia ter sido proferida por Popper, mas consta dos aforismos de Nietzsche.
- A metafísica, a arte e a religião têm como objetivo "colorir o mundo". Só a ciência é capaz de mostrar o real, que não é colorido, mas cinzento. Ela deixa para trás as coisas que ofuscam, que falseiam e que alegram.
- Em Aurora, o homem livre, o homem de livre pensamento é o cientista. Nos livros tardios (Além do Bem e do Mal, Genealogia da Moral), o cientista é só mais um membro da plebe ignara, movido pelo espírito de rebanho.
- "Uma crença forte prova apenas a sua força, e não a sua verdade".