segunda-feira, 2 de março de 2015

Esquema de leitura: Meio século de Primavera Silenciosa: um livro que mudou o mundo, de Ramón Stock Bonzi.

Centro Universitário de Brasília - Uniceub
Faculdade de Direito
Pós Graduação em Direitos Sociais, Ambiental e do Consumidor
Monografia Final
Discente: Juliana Capra Maia
Ficha de Leitura
Texto: BONZI, Ramón Stock. Meio século de Primavera silenciosa: um livro que mudou o mundoDesenvolvimento e Meio Ambiente, n. 28, p. 207-215, jul./dez. 2013. Editora UFPR.  

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Introdução

** Publicação antecipada, na revista New Yorker, no verão de 1962, de trechos de Primavera Silenciosa, o quarto livro de Rachel. O livro só seria publicado em setembro.

** Primavera Silenciosa: denúncia do uso desenfreado de pesticidas que colocaria em risco a fauna, a flora e a saúde humana >>> 
  • Gerou um debate nacional a respeito dos pesticidas, da responsabilidade da ciência e dos limites do progresso tecnológico.
  • Até hoje é alvo de críticas. 
  • A publicação do livro é um acontecimento comunicacional que mudou o mundo. A essa obra tem sido atribuído o nascimento do movimento ambientalista moderno.

** Questão: como um livro que destoava tanto com o senso comum da época pôde conquistar legitimidade e tornar-se um dos produtos culturais mais importantes da história recente?


O ambiente faz a alma

** Rachel Carson >>> 
  • Mãe do ambientalismo.
  • Escritora de mão cheia. Publicou a sua primeira história, "A Battle in the Clouds", aos dez anos de idade.
  • Influenciada por sua mãe, Maria Mc Lean, a escrever e a observar a natureza.
  • Ingressou na Faculdade da Pensilvânia para Mulheres, com planos de se graduar em língua inglesa. Acabou alterando sua opção para biologia, por incentivo de uma professora.
  • Estudou no Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole e tornou-se mestre em zoologia pela Universidade John Hopkins, em 1932.
  • Sem dinheiro para continuar os estudos, Carson passou a trabalhar como assistente de um laboratório na área de genética. Para garantir renda extra, começou a escrever artigos sobre a história natural da Baía de Chesapeake.
  • 1936: ingressa no Departamento Federal de Pesca. 
  • 1941: Publica Under the Sea Wind, que recebeu boas críticas, mas que não vendeu satisfatoriamente.
  • 1945: ano em que Carson, supostamente, tomou conhecimento dos impactos do DDT na fauna aquática. Essa informação consta de  The Gentle Subversive, Lytle (2007, p. 148).
  • 1951: lançamento de "The Sea around Us". Trata-se de um apanhado das pesquisas oceanográficas de Rachel Carson, que levou 10 anos para escrevê-lo. Rendeu prêmios e fama.
  • 1955: lançamento de "The edge of the sea". Consagração de Carson como a principal escritora de ciências nos Estados Unidos.


Viver melhor através da química

** Desde 1940, a "Revolução Verde" vinha progressivamente aumentando a produção rural, por meio do desenvolvimento de sementes de alto rendimento, sistemas de mecanização, herbicidas, fertilizantes, fungicidas e pesticidas químicos.
  • "Uma vida melhor através da química" era possível e desejável.
  • Fertilizantes desenvolvidos com "sobras" da 2ª Guerra Mundial.
  • DDT: utilizado em batalha para combater os insetos transmissores de tifo, febre amarela e malária.
A confiança na “química” era tanta que crianças eram borrifadas com DDT a fim de combater pulgas e mosquitos. A publicidade exortava as donas de casa a se livrarem de baratas com a aplicação do pesticida. Um método seguro que podia ser aplicado até no quarto do bebê. No nível governamental, entomologistas e agentes da saúde envolvidos em campanhas de controle da malária chegavam a comer colheradas de DDT para convencer a população de que a substância não representava perigo. Os capitães da indústria ostentavam ainda o máximo reconhecimento científico: o Prêmio Nobel de Medicina de 1948 foi concedido ao químico Paul Müller por descobrir a utilidade do DDT como inseticida. Pp. 209.


Chamado selvagem

** Primavera silenciosa não estava nos planos de Rachel Carson. Após a publicação dos livros a respeito do mar, a autora escreveria acerca da era atômica. Carson teria mudado de ideia após receber um pedido de socorro de uma amiga, Olga Owens Huckins, proprietária de um santuário da vida selvagem. Em carta, Olga denunciava a mortandade de pássaros após a pulverização de uma propriedade vizinha.

** Carson julgou que a questão merecia a publicação de um artigo na imprensa. Reestudando o caso, optou pela elaboração de um livro curto. Esse livro seria publicado quatro anos depois, em 1962.


Uma outra revolução verde

** O livro tornou-se um best seller tão logo foi lançado. Mas por quê?
  • Para o autor, isso decorreu da associação, realizada por Rachel Carson, entre o controle químico de insetos e a bomba atômica. Observação: a crise dos mísseis em Cuba quase levou EUA e URSS a uma guerra nuclear em 1962.
  • O tema nuclear era extremamente sensível. Qualquer associação com a questão nuclear tinha grande potencial para gerar comunicação.
  • A associação entre o uso da talidomida e a má formação fetal também ocorreu na época do lançamento do Silent Spring. O livro beneficiou-se da associação entre pesticidas e a talidomida: tanto uns quanto outra eram utilizados sem suficientes testes prévios.  
Desta maneira, bomba atômica e talidomida forneciam esquemas de aprendizado que facilitavam a apreensão das novas informações que Carson trazia ao conhecimento do grande público com seu Silent Spring. Pp. 211.


O império contra-ataca

** Quase imediatamente, a autora tornou-se alvo de ataques vindos do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos e da indústria de pesticidas, que gastou 250 mil dólares em “relações públicas” a fim de desqualificá-la.

** Mais famoso crítico de Silent Spring: Robert White-Stevens, bioquímico e diretor-assistente da divisão de pesquisas agronômicas da American Cyanamid. 
  • Acusou Silent Spring de contemplar descrições grosseiras da realidade; desacreditou Rachel Carson por ser uma mulher solteira aos 55 anos de idade, bem como de ser uma cientista "menor" (já que: 1) não era doutora; 2) era bióloga, e não bioquímica).
  • Ridicularizava a idéia de "equilíbrio ecológico", defendendo o argumento de que os seres humanos haviam adquirido o direito e o poder de manipular a natureza como quisessem. 


Da paisagem como legítima defesa

** O clamor dos ambientalistas transformou a mídia na "voz do povo".

** Rachel Carson posiciona-se como defensora de bandeiras humanistas apreciadas "pela maioria das pessoas”, tais como "a sobrevivência da raça humana, a conservação e a preservação da natureza, o direito à qualidade de vida/saúde e até a defesa do símbolo nacional do país, a águia americana" Pp. 213.

** Rachel Carson coloca-se em defesa da wilderness, um conceito-valor que estaria associado à própria identidade dos norte-americanos >>> acréscimo de legitimidade.  


Da ciência como legitimadora do discurso

** Evidências científicas de que o uso de pesticidas afeta os insetos polinizadores, prejudicando, portanto, os rendimentos econômicos provenientes da agricultura >>> Paisagens inúteis tornam-se produtivas. Elas fornecem "serviços ambientais", um conceito que só seria aprofundado nas décadas subsequentes.

** Os ataques da indústria química perderam boa parte de sua força após a publicação do Parecer do Comitê de Consultoria Científica da Presidência, em 15 de maio de 1963. O documento ratificou a existência de fatos que endossavam os argumentos do livro de Rachel Carson. 

Parecer do Comitê de Consultoria Científica da Presidência dos EUA >>> Legitimidade científica aos argumentos de Silent Spring.

** 1972: proibição do DDT nos EUA pela EPA (Environmental Protection Agency). 

** Em 2006, a OMS deu parecer favorável ao uso do DDT nos países africanos afetados pela Malária, ao argumento de que os seus benefícios em ambientes fechados ultrapassam os seus riscos à saúde humana


Considerações Finais

A permanência da obra se deve muito mais ao que Primavera silenciosa trouxe de novo enquanto visão de mundo do que em termos de descobertas científicas. Seu poder comunicacional repousa na capacidade que a autora teve de retirar a questão dos “biocidas” da esfera técnico-científica para abordá-la na arena pública, evidenciando a necessidade de uma nova concepção civilizatória que não trate a Natureza como inimiga do Homem. Como sabemos, esta é uma ideia-chave do ambientalismo moderno. Pp. 214.

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