Universidade de Brasília - UnB
Centro de Desenvolvimento Sustentável - CDS
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Sustentável / Doutorado
Discente: Juliana Capra Maia
Artigo
Referência: MAIA, Juliana Capra. Cultura, identidade e cuidado com a natureza. Sustentabilidade em Debate, v. 6, n. 3, p. 15-31, set/dez de 2015. Disponível em http://periodicos.unb.br/index.php/sust/article/view/15637/12302.
Cultura,
identidade e cuidado com a natureza
Juliana Capra Maia[i]
RESUMO
O artigo foi construído
ao redor de duas indagações logicamente conectadas, que emergem do referencial
teórico elaborado por Louis Dumont aplicado à realidade brasileira. Inicialmente,
investiga-se se a sociedade brasileira atribui à natureza status equivalente àquele atribuído pelas sociedades ocidentais
modernas, das quais a estadunidense é emblemática. Em seguida, questiona-se se,
no Brasil, o trato antropocêntrico e utilitário das questões ambientais é
favorecido em prejuízo dos argumentos baseados no valor intrínseco da natureza.
Referidas questões são respondidas por meio de pesquisa bibliográfica em história
geral e brasileira. As conclusões apontam para a ratificação da tese de Da
Matta, para quem a natureza está inserida na hierarquia social, não havendo que
se falar, no Brasil, em ruptura natureza versus
cultura. Em função da posição da natureza na hierarquia social, argumentos
antropocêntricos, utilitários e conservacionistas tendem a angariar mais
adeptos que argumentos biocêntricos, éticos e preservacionistas em prol da
proteção à natureza.
Palavras-chave: Modernidade. Ideologia. Natureza selvagem. Conservacionismo. Preservacionismo.
ABSTRACT
This paper has been written focusing two connected questions relating Dumont’s
theories to Brazilian reality. First, it investigates whether Brazilian and
modern western societies – specially the american society – see nature through
the same lenses. Second, it discusses whether, in Brazil, the anthropocentric
and utilitarian reason is favoured at the expense of biocentric and ethical
arguments in defence of wilderness. Both
questions are answered through bibliographical research in General History and Brazilian
History. This paper corroborates Da Matta’s thesis according to which nature is
inserted into the Brazilian social hierarchy: there is no rupture between
nature and culture. Due to the position of nature into the social hierarchy the
anthropocentric, utilitarian and conservationists arguments tend to obtain more
influence than the biocentric, ethical and preservationist ones.
Key-words: Modernity. Ideology. Wilderness. Conservationism.
Preservationism.
1.
INTRODUÇÃO
Grosso
modo, a “modernidade” é um fenômeno social, determinados “estilo, costume de
vida ou organização social que emergiram na Europa a partir do século XVII e
que ulteriormente se tornaram mais ou menos mundiais em sua influência” (GIDDENS, 1991, p. 11). As especificidades
da modernidade frente às demais formações sociais vêm sendo tema de vários debates
nas ciências sociais, os quais ocuparam os fundadores da disciplina e ainda
ocupam cientistas sociais contemporâneos (MARX, 2008; DURKHEIM, 1995; WEBER,
1999; GIDDENS, 1991).
Mediante
análise etnográfica do sistema de castas indiano e das teorias de Durkheim e Mauss,
Dumont (1992, 1993 e 2000), associou, de um lado, ideologia hierárquica,
holismo e sociedades tradicionais e, de outro lado, ideologia igualitária,
individualismo e sociedades modernas. Essa formulação foi encampada por Da
Matta (1986 e 1993) e por Oliveira (2000 e 2011) que, comparando EUA e Brasil,
identificaram, aqui, uma sociedade predominantemente hierárquica ou pré-moderna
que, contudo, aspira ostensivamente o igualitarismo e a modernidade.
Este artigo
trabalha duas hipóteses entrelaçadas que emergem do confronto entre o citado referencial
teórico e temas da história ambiental. Ambas são testadas via pesquisa
bibliográfica e análise de dados secundários. São elas: I. A sociedade
brasileira e as sociedades ocidentais modernas atribuem à natureza status diferentes. Enquanto a sociedade
brasileira (tipicamente hierárquica ou holista) trataria natureza e cultura como um continuum, as sociedades ocidentais modernas (tipicamente igualitárias
ou individualistas) enxergariam ruptura entre ambas. II. A ruptura entre
natureza e cultura levada a efeito pelas sociedades individualistas abriria
espaço para argumentos não-utilitários da proteção ambiental. Por sua vez, a
forma com que encaramos a natureza no Brasil favoreceria o trato antropocêntrico
e utilitário das questões ambientais, em prejuízo de argumentos éticos ou estéticos.
Pela mesma razão, entre nós, a agenda conservacionista seria mais bem recebida que
a preservacionista.
Para
atingir tais objetivos, este artigo foi estruturado em seções intituladas,
respectivamente, “modernidade e pré-modernidade: as ideologias individualista e
holista”; “o lugar da natureza no ocidente moderno” e “natureza e cultura
brasileira”. Na primeira seção, discute-se o referencial teórico-metodológico que
apoia o debate trazido neste artigo. A segunda e a terceira seções visam
possibilitar a comparação histórica entre aspectos das ideologias individualista
e holista, bem como as suas respectivas repercussões no cuidado com a natureza.
2. MODERNIDADE E PRÉ-MODERNIDADE: AS IDEOLOGIAS INDIVIDUALISTA E
HOLISTA
Os
trabalhos de Dumont (1992, 1993 e 2000) forneceram às ciências sociais
instrumentos que permitem certos graus de generalização e de comparação entre
culturas. A mais citada contribuição do autor é a associação entre: a) ideologia
hierárquica, holismo e sociedades tradicionais e; b) ideologia igualitária,
individualismo e sociedades modernas. Essa contribuição, apresentada em Homo Hierarchicus (1992), O Individualismo (1993) e Homo Aequalis (2000), foi construída a
partir de etnografia a respeito da sociedade de castas indiana (DUMONT, 1992) e
de estudos bibliográficos sobre a ideologia ocidental moderna (DUMONT, 2000).
Em Homo Hierarchicus (1992), Dumont
identificou, na sociedade indiana, duas categorias de sujeitos: o
“indivíduo-no-mundo” e o “indivíduo-fora-do-mundo”. Essas categorias acabaram
se mostrando essenciais para a posterior elaboração do binômio “pessoa” versus “indivíduo”, central na obra de Da
Matta (1993 e 1996) e seguidores – inclusive Oliveira (2000) – nos seus vários
ensaios comparativos de interpretação da cultura brasileira face à cultura estadunidense.
De
acordo com Dumont (1992), o “indivíduo-no-mundo” é profundamente dependente de
seu meio comunitário ou social. Os seus deveres e laços de solidariedade para
com os demais são estreitos e as suas ações são direcionadas à perpetuação da
ordem social. Essa circunstância lhe confere posições claras em uma enorme
cadeia hierárquica. Ao arranjo societário que essas relações originam, Dumont
denominou “holismo” (DUMONT, 1992), predominante na Índia e em diversas
sociedades denominadas “arcaicas”, “pré-modernas” ou “tradicionais”.
Dumont
também identificou na Índia, residualmente, o cerne do princípio individualista
no “indivíduo-fora-do-mundo”. Trata-se do renunciante, ator que abandona a vida
em sociedade, com os seus emaranhados e laços, restrições e dívidas, para se
dedicar apenas ao auto-aperfeiçoamento. O renunciante é essencialmente
antissocial, dotado de autonomia e individualidade. “Superior e exterior à
sociedade propriamente dita” (DUMONT, 1992, p. 296), o renunciante se constrói
e se afirma por meio da negação do princípio hierárquico ou holista.
Voltando,
como um espelho, os resultados obtidos na Índia para a sociedade a que
pertencia, Dumont elaborou o seu diagnóstico sobre as peculiaridades do
ocidente moderno. No ocidente, o indivíduo foi paulatinamente construído como
um valor em si mesmo (LUZ e FRACALANZA, 2013) ou, para usar as palavras do
autor, como “valor moderno cardeal” (DUMONT, 1993, p. 269). Observe-se que é
precisamente o predomínio da ideologia individualista desde o século XVII que
permitiu ao autor referir-se às “sociedades ocidentais modernas” como um bloco
mais ou menos homogêneo, contraposto às sociedades de ideologia holista (todas
as demais) embora reconhecesse várias diferenças, por exemplo, entre sociedades
dos EUA, França e Alemanha (modernas e individualistas), ou entre as sociedades
da Índia, das Ilhas Trobriand e da Etiópia (não ocidentais modernas e holistas).
Tal
como o renunciante, o indivíduo ocidental é antissocial e constitui um ser
moral independente, autônomo, livre de laços ou hierarquias. Os seus vínculos
mais valorizados não são com pessoas, mas com coisas (DUMONT, 1993 e 2000). Porém,
não há de sua parte uma renúncia à vida social: ao contrário, o indivíduo é
concebido como finalidade última das agremiações humanas. Assim, comparadas à
sociedade indiana, as sociedades modernas criaram um sujeito híbrido, a que
Dumont (1983) denominou “indivíduo-fora-do-mundo-dentro-do-mundo” ou, apenas,
“indivíduo”.
A
invenção do “indivíduo” teria constituído uma “revolução nos valores engendrada ao longo dos séculos no Ocidente
Cristão” (DUMONT, 2000, p. 19), situação excepcional na história das ideias e, por
isso, problema central para a comparação entre culturas (DUMONT, 2000). Ela
seria a raiz da lógica autônoma da política e da economia, das próprias instituições
políticas e econômicas e, assim, da complexificação ad infinitum das sociedades modernas (DUMONT, 2000).
3. O LUGAR DA
NATUREZA NO OCIDENTE MODERNO
Resultado
de milênios de especulações a respeito das peculiaridades humanas frente aos
demais seres vivos (THOMAS, 2010), na modernidade, a relação entre natureza e cultura
foi historicamente construída em termos de exclusão mútua: a cultura é ausência
de natureza; a natureza, ausência de cultura.
O
conceito wilderness reforça esse
argumento. Inaugurado no século XIII, mas popularizado apenas no século XIV (com
as traduções inglesas da bíblia latina) wilderness
originalmente designava as terras áridas que foram palco de passagens bíblicas:
no início, o termo era associado a desertos. A vinculação entre wilderness e florestas tem raízes teutônicas
e nórdicas, em que áreas incultas, de regra, eram florestadas (NASH, 1982).
Com as
primeiras incursões britânicas na América, wilderness
passou a designar natureza em sentido forte (Thomas,
2010), isto é, “an insecure and
uncomfortable environment against which civilization had waged an uncesasing
struggle” (NASH, 1982, p. 08). A associação do vocábulo às terras estéreis
e desgastadas se diluiu: wilderness passou
a se referir a florestas virgens, de que a América era pródiga. Como as matas eram
obstáculos ao progresso, vigoravam valores culturais que estimulavam as
devastações. Os adjetivos associados às florestas em um dicionário poético do
século XVI – “terrível”, “sombria”, “selvagem”, “deserta”, “agreste” e
“melancólica” – revelam os sentimentos dos britânicos face à natureza virgem (Thomas, 2010).
A concepção
pejorativa dos escritores britânicos acerca da wilderness era familiar aos primeiros colonos que se dirigiram para
a Nova Inglaterra (Nash, 1982; MC
CORMICK, 1992). Não se estranha, assim, que os pioneiros (em especial os das fronteiras)
se mostrassem obstinados com derrubadas de florestas, drenagens de pântanos ou
alterações nos cursos dos rios, extinguindo a wilderness por meio da adaptação da natureza aos imperativos do
progresso (NASH, 1982).
Também não estranha que o tratamento dispensado aos
indígenas submetidos à Coroa Portuguesa tenha sido tão diferente daquele
dispensado aos que se depararam com os pioneiros nos futuros EUA. Lá, os
ameríndios foram tomados como selvagens (associados à wilderness) e tratados como povos estrangeiros com os quais, ao
longo do processo de conquista do Oeste (OLIVEIRA, 2000), os pioneiros firmaram
tratados de paz e contra os quais decretaram guerras. Os indígenas das terras
americanas sob jugo português, por sua vez, foram considerados súditos sui generis e incluídos na hierarquia
social em estrato inferior[1].
A
hostilidade dos colonos da Nova Inglaterra para com a natureza selvagem era um
traço cultural firme. Ela foi percebida por Tocqueville (1987) que visitou a
América quase três séculos depois da fundação dos primeiros povoados, em 1831. Além
de uma função pragmática, a domesticação da wilderness
entre os colonos norte-americanos também exercia uma função simbólica relevante:
a wilderness era tomada como terra
amoral, maldita, caótica (NASH, 1982). Em uma metáfora que remete ao mito de
Lilith[2], a wilderness, de imensidão infinita, convidava os colonos a uma
liberdade perigosa, sinônimo de ruptura com os limites impostos pela
civilização, induzindo à perdição moral da nascente sociedade dos EUA. Desse
modo, exorcizar a natureza selvagem para domesticar a terra não era apenas uma
questão de sobrevivência, mas uma missão em favor da pátria, da raça e da boa obra
de Deus. Em suma, para os colonos, avançar progressivamente sobre terras desconhecidas
dos homens brancos era um imperativo moral.
Daí a
associação, no ideário e na literatura dos EUA, entre os conceitos wilderness e frontier. Em termos gerais, a wilderness
foi construída como aquilo que está depois da fronteira: o “não-civilizado”,
o “não-eu”, o “outro”. Compreende-se, igualmente, onde repousa a dissociação
entre civilização e wilderness que, ao
fim e ao cabo, corresponde ao divórcio entre cultura e natureza. Essa
representação é válida tanto para ingleses quanto para estadunidenses e laborou
em favor do estabelecimento de uma fronteira excludente nos EUA (HENESSY,
1978).
3.1.
O conceito-valor “wilderness” e a conservação
da natureza
Na
Inglaterra, o sentimento de demérito para com a wilderness, que estimulava a destruição da natureza selvagem, perdurou
pelo menos até o final do século XVIII, não havendo que se falar, antes disso, sobre
preocupações conservacionistas (THOMAS, 2010).
Entre
o final do século XVIII e o início do século XIX, num movimento que Nash (1982)
considera uma verdadeira revolução cultural, a aversão à wilderness começou a mudar. Provável resultado da degradação
ambiental provocada pelas primeiras etapas da Revolução Industrial (THOMAS,
2010; BURSZTYN e BURSZTYN, 2012), a Inglaterra testemunhou a difusão da mística
da natureza. A wilderness passou
então a ser considerada sublime, expressão viva do poder de Deus e fonte de
renovação espiritual: “Em fins do
século XVIII, o apreço pela natureza [...] se convertera numa espécie de ato
religioso. A natureza não era só bela; era moralmente benéfica” (THOMAS, 2010,
p. 368).
Os estadunidenses
não ficaram alheios a esse movimento. Ao contrário, de acordo com a abordagem mítica
e historiográfica de Turner (1976), a identidade nos EUA teria sido construída
e renovada pelo contato permanente da civilização com a wilderness, ou seja, com a fronteira sempre situada a oeste das
áreas colonizadas. Isso incentivou o florescimento de ideias inovadoras,
sugeridas por pensadores na vanguarda do ambientalismo: Thoreau (2012), Muir
(NASH, 2012), Pinchot (NASH, 2012) e Leopold (2008). Esses autores são
precursores do preservacionismo e do conservacionismo, correntes que ainda hoje
disputam os diagnósticos e as soluções para as questões ambientais.
3.2
Preservacionismo e conservacionismo: origens e conceitos
Turner
(1976), criador do mito historiográfico da fronteira nos EUA, afirmava que as
instituições estadunidenses teriam sido compelidas a se adaptar ao permanente
espraiamento da população. Em outras palavras, teriam se adaptado às
contingências implícitas no atravessar e no povoar de sucessivas regiões de um
continente, nas vitórias sobre a natureza selvagem e no desenvolvimento de cada
área, transformando as condições econômicas e políticas primitivas na
complexidade da urbe. Desse modo, o desenvolvimento político e social dos EUA,
no rumo de uma tradição individualista e democrática, teria nascido e renascido
continuamente a partir da fronteira, definida ora como local do encontro físico
entre a civilização e a wilderness,
ora como o fenômeno social decorrente da interação entre esses elementos. O fenômeno da fronteira – ao qual a
historiografia dos EUA ainda atribui forte papel na formação da identidade
nacional – ocorreu entre 1607 e 1890, da Costa Leste em direção à Oeste, e só
se exauriu quando os pioneiros chegaram ao Oceano Pacífico (TURNER, 1976; WEBB,
1979; HENESSY, 1978; SLATTA, 1988).
Cerca
de quarenta anos antes de 1890, quando foi oficialmente decretado o fim de terras
públicas disponíveis em grande escala para novos assentamentos de colonos no
Oeste dos EUA, isto é, quando a fronteira chegou ao fim, Thoreau, filósofo
transcendentalista, publicou Walden (THOREAU,
2012). Na contramão da consolidada
tradição calvinista de repúdio à natureza, a obra é um manifesto contra a
civilização industrial, contra o consumismo e a favor da wilderness.
Thoreau
(2012) defendia que os seres humanos deveriam retornar à frugalidade (meta cara
ao ambientalismo contemporâneo) de modo que a sua vida estivesse equilibrada
entre a civilização e a wilderness,
situação existente na arcádia, isto é, no modo imemorial de vida rural. Thoureau
clamava pela necessidade de preservação da wilderness,
local em que os humanos civilizados podem encontrar o melhor de si mesmos: a
sua pureza animal ou “wildness” (NASH,
1982).
Quer
por critérios utilitários, quer pelo reconhecimento do valor intrínseco da wilderness, as propostas de Thoreau e de
seus seguidores, favoráveis à criação de áreas protegidas, geraram frutos. Em
1864, a preocupação dos agricultores do Central Valley – Califórnia/EUA com a
proteção da água de degelo que utilizavam para irrigar as suas plantações resultou
a criação do Parque Estadual de Yosemite Valley (NASH, 1982). Embora não fosse
uma UC inteiramente dedicada à preservação e embora as suas dimensões não
fossem extensas, a criação desse parque representou um antecedente relevante
para o cuidado com a natureza nos EUA.
Em
1872 foi criado o Parque Nacional de Yellowstone. A finalidade inicial de sua
criação residiu na prevenção contra a apropriação privada de curiosidades do
mundo natural: vales, cachoeiras e gêiseres (NASH, 1982; BURSZTYN e BURSZTYN,
2012). A criação desse e de outros parques gerou críticas e contrariou
interesses de empreiteiros de estradas de ferro, fazendeiros, pecuaristas e
mineradores. O debate sobre o parque contemplou argumentos utilitários
(abastecimento público de água potável, por exemplo) e éticos em prol da
preservação da wilderness.
Vinte
anos após a publicação de Walden, o
primogênito de um fazendeiro calvinista escocês, influenciado pelo
transcendentalismo de Thoreau, iniciou carreira literária como defensor da wilderness, inclusive reivindicando, em
seu favor, status equivalente àquele
atribuído aos seres humanos. Trata-se de Muir (NASH, 2012), um dos maiores
divulgadores da causa ambiental e precursor do que ficou denominado,
posteriormente, como “biocentrismo” ou “preservacionismo”.
Militante
cercado por um grupo influente, Muir foi criador do Sierra Club, associação
civil de proteção dos Parques de Yosemite e de Yellowstone e responsável por
pressionar pela criação de outras áreas protegidas. Ainda hoje o Sierra Club é
uma das mais influentes organizações ambientalistas dos EUA (NASH, 2012; BURSZTYN
e BURSZTYN, 2012). Além disso, credita-se a Muir a transformação do Parque
Estadual de Yosemite em parque nacional, o que fortaleceu a sua fiscalização e
administração.
Muir
mantinha bom contato com Pinchot, engenheiro florestal, político e principal
porta-voz do utilitarismo em matéria de conservação ambiental nos EUA (NASH,
2012). Pinchot e seus seguidores “defendiam a exploração racional dos recursos
naturais, a constituição de reservas ambientais e propunham uma racionalidade
econômica e a necessidade de se estabelecer regras bioeconômicas adequadas”
(BURSZTYN e BURSZTYN, 2012, p. 74). Sob esse aspecto, os conservacionistas eram
(e ainda são) eminentemente antropocêntricos, dado que explicitamente propõem,
com sua intervenção, maximizar a disponibilidade de recursos naturais ao maior
número possível de pessoas (TAVOLARO, 2000).
O
dilema da construção, nos limites do Parque Nacional de Yosemite, da barragem
de Hetch Hetchy, destinada a abastecer com água a cidade de São Francisco,
acabou por colocar Muir e Pinchot em lados opostos. A cisão até hoje divide o
movimento ambientalista dos EUA (NASH, 1982) em preservacionistas (seguidores
de Muir) e conservacionistas (seguidores de Pinchot). Apesar das dissonâncias, Muir
e Pinchot tinham uma plataforma comum de subtrair grandes extensões das terras públicas
ao laissez-faire de uma economia em
expansão acelerada e que se transformaria, no ocaso do século XIX, na maior do
mundo.
Cita-se,
por fim, a contribuição de Leopold para a consolidação de novas perspectivas acerca
do cuidado com a natureza. Formado em Yale, agente do serviço florestal dos EUA,
professor de gestão de caça no departamento de economia agrícola da Universidade
de Wisconsin e fundador da Wilderness
Society (LEOPOLD, 2008; NASH, 1982), o seu texto mais conhecido é o livro Pensar como uma montanha. Nesse trabalho
de 1949 Leopold descreve a “ética da terra” (land ethic). Para Leopold, a ética da terra alargaria os limites
das comunidades para incluir os solos, as águas, as plantas e os animais. Assim,
o juízo de certo ou errado estaria diretamente relacionado à capacidade de
preservação da integridade, da estabilidade e da beleza da comunidade biótica (LEOPOLD,
2008; NASH, 1982).
É bem
verdade que, nos EUA, a política fundiária democrática, o incentivo à imigração
de massas, a inexistência de uma nobreza ou de uma igreja oficial detentora de
latifúndios contribuíram para que os recursos naturais fossem utilizados de forma
avassaladora. Também é verdade que, há poucos anos, as preocupações
ambientalistas nos EUA eram taxadas como excentricidades. Contudo, o que se
quer ressaltar neste artigo é a circunstância de que elementos ideológicos
fundamentais presentes nos EUA (em especial o igualitarismo e a clara separação
entre natureza e cultura) permitiram o surgimento de ideações em que solos,
águas, plantas e animais receberam, tal qual os humanos, o status de sujeitos. Diante
de peculiaridades culturais, há grandes obstáculos para que o mesmo resultado seja
alcançado no Brasil.
4. NATUREZA E CULTURA BRASILEIRA
4.1
A natureza como parte da ordem social
Com o referencial
teórico dumontiano aliado à historiografia de Sérgio Buarque de Holanda, Caio
Prado Júnior e Gilberto Freyre, Da Matta interpreta a sociedade brasileira como
excepcional. Embora ela seja predominantemente holista (pré-moderna), é desejosa
de individualismo (ou seja, de modernidade), o que é atestado pelo investimento
na construção de instituições tipicamente ocidentais. Essa abordagem,
denominada por Da Matta (1986) como “o dilema brasileiro”, ganha consistência nas
suas análises comparativas entre cultura brasileira e dos EUA.
De
acordo com Da Matta (1986), no Brasil, o enfrentamento entre os princípios
individualista e holista ocorre em diversas esferas: no trato diário com a lei
(“jeitinho”), nas situações de conflito (“você sabe com quem está falando?”) e
na forma de lidar com a natureza (DA MATTA, 1993). A natureza (como todo o
resto) faria parte de uma grande teia de hierarquias, teia que engloba
sujeitos, animais, empresas, costumes, instituições e mesmo o “além”. Noutras
palavras, no Brasil, não há ruptura, exclusão ou cisão entre natureza e cultura;
há antes um continuum ou, para
utilizar a terminologia de Dumont (1992), uma relação entre englobante e
englobado.
Oliveira
(2011) já tratou da função simbólica desempenhada pela natureza no imaginário
social brasileiro. Para ela, tanto no Brasil quanto nos EUA a natureza teria assumido
papel central na construção das identidades nacionais. Lá, entretanto, a
natureza (wilderness) teria sido
identificada com o oposto da civilização e, pois, com a dinâmica das fronteiras
que está na raiz da imagem icônica do cowboy
(OLIVEIRA, 2000). Por sua vez, no Brasil, o aspecto mais ressaltado da natureza
seria o exotismo, o tropicalismo, tratado como pedra angular – e, acrescenta-se,
como dimensão mais englobante – da nossa sociedade (OLIVEIRA, 2011).
Conforme
explica Oliveira (2011), os relatos dos viajantes, naturalistas, artistas e expedicionários
europeus do século XIX teriam mediado a construção da autoimagem brasileira. Os
referidos relatos exaltavam, num misto entre espanto e deslumbramento, o
gigantismo e o caráter exótico da fauna, da flora e do clima dos trópicos. A
natureza tropical seria tão sui generis que
atuaria como força motriz da nova e peculiar civilização que se estabelecia
nestas paragens. O calor e a umidade dos trópicos seriam responsáveis não
apenas pelo exotismo da natureza, mas pela formação moral da população
brasileira, cujo caráter era então descrito como preguiçoso, erotizado ou mesmo
triste. O discurso acabou incorporado à retórica intelectual brasileira da
época, de modo que as características físicas dos trópicos passaram a ser
interpretadas como causas finais do nosso atraso civilizatório.
O determinismo
físico-climático típico do século XIX foi bastante atenuado com o ulterior desenvolvimento
das ciências sociais. Não obstante, elementos que remetem à natureza exuberante
dos trópicos ainda fazem parte do cotidiano dos brasileiros. Eles estão
espalhados no nosso pensamento social, nos símbolos nacionais, nas artes
visuais.
O
pensamento social brasileiro é pródigo em autores que interpretaram as
condições naturais sui generis como
concausas da nossa formação social, tais como Capistrano de Abreu, Gilberto
Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Euclides da Cunha e Celso Furtado (TAVOLARO,
2011).
Os
símbolos nacionais seguem o mesmo caminho. As cores verde e amarela estampadas
na bandeira brasileira constituem, a um só tempo (LUZ, 1999): 1) metáforas para
as florestas e para as riquezas minerais do Brasil; 2) referência a Portugal e
Algarves; e 3) símbolo das dinastias reais de Bragança (a que pertenciam D.
Pedro I e II) e de Habsburgo (a que pertencia D. Leopoldina). O Hino Nacional,
por sua vez, também faz diversas referências à natureza excepcional, palco da
nova civilização tropical que se erguia no Brasil. Não é outra a mensagem de
trechos como “gigante pela própria natureza”; “do que a terra mais garrida
/teus risonhos, lindos campos têm mais flores”; “nossos bosques têm mais vida”
e “deitado eternamente em berço esplêndido, ao som do mar e à luz do céu
profundo”.
Nas
artes visuais dos mais distintos períodos da nossa história, há incontáveis associações
entre o Brasil e a natureza exuberante, associações que vão desde fotografias
estampadas em camisetas ou em pôsteres publicitários até o óleo sobre madeira
de autoria de Di Cavalcanti, intitulado “Nu Deitado” (DI CAVALCANTI, c. 1935). No
quadro, o pintor retrata uma mulata cujas curvas se confundem com o relevo
acidentado do Rio de Janeiro. Ali, como observou Carvalho (1998), mulher
brasileira e natureza são retratadas em unidade.
Para
além dessas circunstâncias, a inclusão da natureza na hierarquia social também parece
ser uma característica arraigada no imaginário popular. Essa é a hipótese
apresentada por Carvalho a respeito da sobrevivência do motivo edênico, isto é,
da visão paradisíaca, no imaginário dos brasileiros (CARVALHO, 1998). Em
diagnóstico obtido via pesquisas de campo, Carvalho demonstrou que, quase 200 anos
depois da Independência, a natureza exuberante ainda prevalece como principal (e
praticamente único) motivo de orgulho dos brasileiros pelo Brasil. Ocorre que a
natureza tropical pertence ao mundo do dado, não das realidades construídas ao
longo da história social brasileira. Por que então nos orgulharmos da natureza,
se ela não é obra nossa, se não participamos da sua criação? Para Carvalho
(1998), a persistência do motivo edênico no imaginário brasileiro está intimamente
relacionada à “razão satânica” que, em síntese, consiste na crença da inadequação
do povo que habita o Brasil. E essa suposta inadequação também seria explicada
por razões naturais.
Por
décadas, jesuítas e historiadores apontaram a remessa de delinquentes para a
colônia e a escravidão como causas da degradação moral do povo brasileiro. Mesmo
assim prevaleceram as explicações racistas endossadas pela ciência novecentista.
Segundo as teorias racistas, os brasileiros estariam condenados à degradação e ao
desaparecimento, dada a desnaturação das raças, provocada pela excessiva miscigenação
entre brancos, negros e indígenas (SEYFERTH, 2002).
No
Brasil, as teorias racistas foram aceitas por intelectuais influentes: Sílvio
Romero, Nina Rodrigues, Euclides da Cunha (CARVALHO, 1998) e Oliveira Vianna (SEYFERTH,
2002). Entre tais autores, todavia, vigorou uma interpretação peculiar do
racismo. Entendiam que o branqueamento, por meio da miscigenação entre mestiços
brasileiros e migrantes europeus, propiciaria a progressiva diluição de
elementos racialmente inferiores, em benefício do processo civilizatório nos
trópicos. Essa abordagem foi adotada como razão de Estado para a elaboração e
execução de políticas públicas de incentivo à imigração europeia e de
desincentivo à imigração africana e asiática (HENESSY, 1978 e SEYFERTH, 2002).
A natureza
tropical é, pois, elemento marcante do imaginário social do Brasil e constitui autêntico
pilar da identidade nacional. Ela está presente nos símbolos nacionais, nas
artes, no pensamento social brasileiro, nos relatos estrangeiros a respeito do
Brasil, nos mitos de fundação da pátria, nas explicações acerca das nossas
supostas deficiências morais, nas nossas práticas ancestrais. Assim, é plausível
o argumento de Da Matta (1993) segundo o qual, entre os brasileiros, há
continuidade entre natureza e cultura (e não ruptura, como ocorre no caso dos
EUA). Tal característica, conforme já explorado neste artigo, seria típica de sociedades
pré-modernas ou de ideologia hierárquica.
4.2.
A natureza subjugada
Paradoxalmente
e em um clássico exemplo da dissociação entre “hierarquia” e “poder” (DUMONT,
1992), nem o holismo, nem o fato de a natureza atuar como pilar da identidade
nacional (dimensão mais englobante) foram suficientes para criar, no Brasil, uma
cultura de cuidado com o meio ambiente. Postulamos que isso se deva ao lugar
ocupado pela natureza no imaginário social brasileiro.
De
acordo com Da Matta (1993), a natureza no Brasil não é apenas parte da hierarquia
social, mas serva dos homens. Como tal, está disponível para a apropriação, pilhagem
ou destruição, isto é, para o “extracionismo predador”. Nas palavras de Da Matta,
“entre os homens e a natureza
estabeleceu-se uma lógica idêntica àquela que governava os homens entre si: a
lógica da desigualdade” (DA MATTA, 1993, p. 140).
Informações
históricas parecem confirmar a tese de Da Matta. O estatuto jurídico dos negros
escravizados e libertos[3], por exemplo, fornece
subsídios para defender o argumento de que, no Brasil, incluímos a natureza na
hierarquia social em posição de menos-poder, e não em oposição à cultura ou à
ordem social.
As
Ordenações Afonsinas (PORTUGAL, 1984), Manuelinas (PORTUGAL, 1984) e Filipinas
(PORTUGAL, 1985), cunhadas a partir das Guerras de Reconquista e, por séculos,
principais normas jurídicas vigentes no Brasil colonial, admitiam textualmente a
escravidão. De tradição latina, o sistema jurídico português se baseia na Civil Law romana e divide o mundo entre
pessoas, coisas (ou bens) e fatos. Nessa classificação, escravos negros, grosso
modo, eram juridicamente considerados bens (ou coisas) semoventes, ocupando o
mesmo patamar dos animais em geral.
Diz-se
“grosso modo”, porque o status dos
escravos negros como bens semoventes — status
sobre o qual os juristas do período discorriam com embaraços (REIS, 2013) —
era incoerente e sequer se aplicava a todos os ramos do Direito. Discutindo a formação
histórica da pena pública no Brasil, Reis (2013) demonstra que, conforme
doutrina jurídica vigente nos séculos XVIII e XIX, no Direito Civil, o escravo
ostentava natureza jurídica de bem ou coisa, motivo pelo qual era passível de
uso, fruição, disposição e reivindicação. O mesmo status se aplicava ao escravo no âmbito criminal, desde que vítima (e
não autor) de crime. Admitia-se, por exemplo, que o escravo pudesse ser a res furtiva do furto ou o objeto de uma
alienação a non domino do estelionato.
Entretanto, especificamente para integrar o polo ativo dos delitos, o escravo era
considerado pessoa, situação que permitia ao Estado persegui-lo e condená-lo
(REIS, 2013).
Sob
outra perspectiva, no Brasil, o status de
escravo não formal ou materialmente imutável. O escravo podia ser alforriado por
um ato de liberalidade de seu senhor ou podia adquirir do dominus a própria liberdade ou a de terceiros. Nesses casos, ao
menos sob a perspectiva normativa, o liberto se transmutava civilmente de coisa
a pessoa; de objeto a titular de direitos. Por meio dessa operação, admitia-se
a ascensão social do escravo alforriado, o que ocorria por meio de seu
descolamento da natureza, isto é, do nível mais baixo na escala de prestígio.
Essa nova situação lhe permitia, inclusive, possuir escravos (CARVALHO, 2011 e
SILVA, 2011).
O
fenômeno da ascensão social do liberto, isto é, a possibilidade de mutação da
sua classificação jurídica, corrobora o argumento de que a ideologia
majoritária na sociedade brasileira admite um continuum entre natureza e cultura. Corrobora também a tese de Da
Matta, acerca da existência, no Brasil, de uma ideologia que privilegia a hierarquia
e o holismo em detrimento da igualdade e do individualismo. A associação
jurídico-normativa entre escravos e animais (bens semoventes), por fim, conduz
à conclusão de que a natureza foi incluída na hierarquia social em situação de
menos-poder. Em outros termos, aqui a natureza é, a um só tempo, a dimensão
social mais englobante (superioridade hierárquica) e a de menor prestígio
(inferioridade em poder).
Os Slave Codes, regulamentos que
disciplinavam a escravidão em diversos Estados dos EUA, demonstram que a solução
brasileira contrastava bastante com aquela adotada no hemisfério norte. Goodell
(1853), estadunidense abolicionista nascido no final do século XVIII, salientou
que normas e jurisprudência acerca dos escravos, nos Slave Codes, eram claras ao estabelecer o cativo negro como
propriedade. Aparentemente, não havia maiores pudores para que operadores do
direito afirmassem que aos escravos, semoventes perpétua e inteiramente
submetidos à vontade dos senhores, era vedado constituir famílias, contratar,
herdar, adquirir bens, receber educação, testemunhar, portar armas ou ajuizar
demandas contra quaisquer pessoas (GOODELL, 1853). Observe-se que boa parte dessas
restrições se mantinha mesmo após a obtenção da liberdade (GOODELL, 1853).
Visando
à “proteção social”, os Slave Codes limitavam
o direito de conceder alforrias, para evitar que a benevolência de alguns senhores
colocasse em liberdade um grande número de “stupid,
ignorant and vicious persons, to disturb its peace and endanger its permanency”
(GOODELL, 1853, pp. 339). Portanto, os negros libertos nos EUA eram
considerados seres integrantes de uma espécie diversa e indesejada que não
podia ser considerada titular de direitos. Os negros estavam efetivamente
excluídos da ordem social e sua mera existência em território estadunidense era
considerada uma ameaça a ser controlada ou eliminada. Nesse contexto, faziam pleno
sentido as políticas de emigração compulsória de negros livres, duramente
criticadas por Goodell (1853).
Diante
dos Slave Codes, concluiu-se que, nos
EUA, nem os escravos, nem os libertos negros eram vistos como membros de menos
prestígio de uma grande hierarquia social. Tomados como herdeiros consanguíneos
de bestas, o reino da cultura lhes era alienígena, impenetrável. A “negritude” consistia
uma nódoa que maculava sucessivas gerações, destituindo os seus portadores das
possibilidades de inclusão social e da ulterior equiparação, em direitos e
oportunidades, aos cidadãos brancos. Nos EUA, tal como a fronteira, o negro (e
a natureza à qual ele era associado) eram “o outro”, o “não-eu”.
Além
do estatuto jurídico dos escravos e dos libertos negros no Brasil, os trabalhos
de Oliveira (2000), Holanda (1995), Dean (1996) e Pádua (1998), também permitem
a associação entre o status subalterno
da natureza e o comportamento denominado por Da Matta (1993) como “extracionismo
predador”.
Oliveira
(2000) destacou a prodigalidade do bandeirante que, radicado principalmente em
São Vicente/SP, percorreu enormes distâncias em busca de escravos e metais
preciosos. Diversamente da figura do pioneiro dos EUA, o propósito do
bandeirante não era a fixação no território por meio da agricultura ou da
pecuária, mas a obtenção de lucro rápido via apropriação do capital natural
disponível na colônia. A mentalidade do aventureiro ainda estaria presente em atividades
econômicas típicas de regiões de fronteira e desenvolvidas na Região Norte do
Brasil, tais como garimpos, biopirataria e a extração ilegal de madeira.
Holanda
(1995), no início do século XX, já salientava que o termo “agricultura” só podia
ser utilizado com reservas ao se discutir o ciclo do açúcar no Brasil. É que as
técnicas produtivas utilizadas nos engenhos, focadas na rápida obtenção de
grandes quantidades de melado, faziam com que a produção açucareira se
parecesse mais com a atividade mineradora, exaurindo o solo em que era
praticada. Desse modo, salientava Holanda, “raramente decorriam duas gerações
sem que uma mesma fazenda mudasse de sítio, ou de dono” (1995, p. 50).
Também
os achados de Dean (1996) corroboram a ocorrência, na história brasileira, do “extracionismo
predador” (DA MATTA, 1993). Estudando os registros de doação de sesmarias ao
longo do período colonial, Dean notou que a adoção e intensificação do regime
indígena da coivara pelos colonos portugueses e mamelucos levaram ao
exaurimento de solos em trechos da Mata Atlântica, cuja fertilidade em grande
parte dependia da existência da floresta. Não se tratava de um comportamento
irracional, mas de uma ação pragmática: como a terra era abundante e gratuita e
podia ser facilmente substituída, não fazia sentido investir tecnologia ou
trabalho para preservar a sua fertilidade (DEAN, 1996). Construía-se no Brasil,
desse modo, “uma forma peculiar, extrativa de capitalismo, no qual o estoque de
capital é totalmente in natura,
preexistente à ocupação neo-européia e rapidamente dissipado, reduzindo a
população ao nível da subsistência” (DEAN, 1996, p. 94).
O “extracionismo
predador” (DA MATTA, 1993) também era familiar a atores sociais do Brasil dos
oitocentos. É o que demonstrou Pádua (1998) que, analisando registros da época
do Império, encontrou clamores pela urgente modernização da agricultura do café
e pelo uso racional dos recursos naturais brasileiros. Os clamores constavam de
documentos escritos por políticos, intelectuais, aristocratas e agricultores,
tais como José Bonifácio de Andrada e Silva, Manoel Ribeiro do Val, o
Comendador Luiz Resende, Guilherme Capanema, Luiz Corrêa de Azevedo, Caetano da
Rocha Pacova, José Saldanha da Gama, Nicolau Moreira e Dionísio Martins. Aliás,
Nicolau Moreira (um dos editores da Revista
Agrícola, publicada pelo Imperial Instituto Fluminense de Agricultura – IIFA)
– referia-se às técnicas agrícolas até então empregadas no Brasil como “reinado
de 375 anos de cultura esgotadora” (PÁDUA, 1998, p. 154), formulação que muito se
assemelha a “extracionismo predador” (DA MATTA, 1993) e a “mineração do solo”
(HOLANDA, 1995).
4.3
As preocupações com a natureza no Brasil
A
partir dos argumentos apresentados, espera-se que, no Brasil, as razões antropocêntricas
e utilitárias para o cuidado com a natureza se sobressaiam às razões biocêntricas
e éticas. Ou seja, se a natureza, nestas paragens, foi de fato incluída na
hierarquia social e em posição de menos-poder, como serva, então os movimentos
e políticas em prol do meio ambiente deverão enfatizar aspectos úteis (não
aspectos éticos) da sua proteção. Pela mesma razão, espera-se que, entre nós, o
conservacionismo encontre mais adeptos que o preservacionismo.
A
comparação do número e das dimensões por categoria de unidade de conservação (UC)
parece confirmar essas deduções. De acordo com dados do Cadastro Nacional de
Unidades de Conservação do Ministério do Meio Ambiente (CNUC/MMA)[4] de fevereiro de 2015, o
Brasil possui um total de 1940 UC, instituídas pelas diversas unidades da
federação e por particulares, as quais ocupam 1.513.828 km2 e se
distribuem pelo continente e pelo oceano. Dessas, 586 (30,2%) são UC de proteção
integral e 1354 (69,8%), de uso sustentável. As UC de proteção integral ocupam 528.007
km2, as de uso sustentável ocupam 1.023.189 km2:
respectivamente 34,9% e 65,1% do território de UC[5]. (BRASIL, 2015).
A Lei
do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) define por UC de proteção
integral aquela cujo principal objetivo é proteger a natureza, admitindo-se apenas
o uso indireto (isto é, que não envolve consumo, coleta, dano ou destruição)
dos respectivos recursos naturais. Por sua vez, as UC de uso sustentável são
aquelas que se propõem a compatibilizar a conservação da natureza com a
exploração de parte dos seus recursos naturais, de forma “socialmente justa e
economicamente viável” (BRASIL, 2005). Pode-se afirmar que a instituição de UC
de proteção integral atenda a plataforma preservacionista, dado o
estabelecimento de espaços com pouca ou nenhuma intervenção humana. Por sua
vez, também se pode afirmar que a instituição de UC de uso sustentável atenda diretrizes
conservacionistas, dada a ênfase no manejo humano dos recursos naturais. Em
consequência, considerando as já citadas informações do CNUC/MMA, forçoso
concluir pela prevalência do conservacionismo sobre o preservacionismo na
política brasileira de instituição de UC.
Além
do número e das dimensões das UC, também a história dos movimentos e das
políticas ambientalistas no Brasil labora em favor das hipóteses trazidas nesta
seção. É que o cerne das preocupações da maior parte dos escritores que se
preocupam com as questões ambientais no Brasil é mesmo o uso racional dos
recursos naturais: manutenção da fertilidade do solo, preservação da
integridade dos mananciais, manipulação de espécies da flora e da fauna para
uso humano, críticas à imprevidência das lavouras e à poluição causada pelas
queimadas.
A geração
de José Bonifácio, estudada por Pádua (1998), dedicava os seus esforços à crítica
contra as técnicas agrícolas utilizadas nas lavouras de café, as quais vinham
contribuindo para a destruição dos recursos naturais. Aqui, proteger a natureza
tinha como finalidade garantir a integridade dos solos e das águas de modo a não
comprometer a exploração agrícola futura. Noutros termos, a geração de José
Bonifácio enfatizou os aspectos úteis, não os aspectos éticos da proteção à
natureza.
Fenômeno
similar ocorreu com a geração do “pensamento autoritário brasileiro”. De acordo
com Franco e Drummond (2009), os intelectuais brasileiros engajados na questão
ambiental ao longo das décadas de 1920/40 formavam um grupo razoavelmente
coeso. Não havia entre eles ou seus seguidores a disputa típica dos EUA entre
preservacionistas e conservacionistas. Mas a maior parte das preocupações do grupo
focava o uso racional dos recursos naturais que, mais tarde, deveriam servir como
substrato material do novo projeto brasileiro de nação. Motivações éticas para
o cuidado com a natureza não eram estranhas ou antipáticas ao grupo mas, em seu
argumento, mesmo parques aos moldes de Yellowstone deveriam atuar, no Brasil,
como “fontes da nacionalidade”, e não só como áreas de excepcional beleza ou de
preservação da biodiversidade. Esse projeto entendia a natureza como totalidade
orgânica e a sociedade como a sua extensão. O Brasil era um país novo que
precisava se conscientizar da íntima relação entre natureza e sociedade para que
o progresso se baseasse no aproveitamento racional das riquezas naturais. A
imprevidência e o esquecimento do vínculo entre o homem e o mundo natural gerariam
pobreza e negariam recursos naturais aos futuros brasileiros. (FRANCO e DRUMMOND,
2009).
A
agenda preservacionista ganha mais espaço com a atuação da Fundação Brasileira
para a Conservação da Natureza (FBCN), fundada em 1958 com o propósito de
promover o uso previdente dos recursos naturais e a instituição de áreas
ambientalmente protegidas. A FBCN, a mais influente associação civil
conservacionista de que se tem notícia na história do Brasil (FRANCO, 2009), apoiou
a instituição de diversas UC em território brasileiro. Franco e Drummond (2009)
relatam que, mesmo em seu período de dormência (1958/66), a FBCN influenciou a
criação de 11 parques nacionais e a elaboração do anteprojeto de lei que
instituiu o Código Florestal de 1965. No auge das suas atividades, entre 1966 e
1989, a FBCN atuou em parceria com o Poder Público, editou revistas científicas,
organizou congressos, elaborou planos de manejo para UC, apoiou a criação de
novas ONG de viés preservacionista e, é claro, apoiou a criação de novas UC.
A
partir do final dos anos 1980, com a redemocratização do país, a FBCN passou a
ser duramente criticada pelos intelectuais que se dedicavam à questão
ambiental. Muitas dessas críticas se dirigiam contra a estratégia estatal (apoiada
pela FBCN) de instituir UC em cujo interior fosse vedada a presença humana (FRANCO
e DRUMMOND, 2009). Os trabalhos de Diegues (2000) e de Dowie (2006) representam
satisfatoriamente esse tipo de crítica.
Desse
modo, as décadas de 1980/90 testemunharam uma mudança de tendência: no lugar de
privilegiar a criação de UC de proteção integral, o Brasil passaria a concentrar
esforços na criação de UC de uso sustentável, com destaque para as reservas
extrativistas, inicialmente concebidas para a Amazônia (DRUMMOND, FRANCO e
OLIVEIRA, 2011).
5. CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Seguindo
o referencial teórico deste artigo, as sociedades podem ser tipicamente
tradicionais (de ideologia predominantemente hierárquica e holista) ou
tipicamente modernas (de ideologia predominantemente igualitária e
individualista). Historicamente, o igualitarismo permitiu que sociedades
modernas produzissem ideações que separam os reinos da natureza e da cultura e
que, com a valorização da natureza, atribuem valor intrínseco ou cidadania a
formas não humanas (águas, solos, fauna, flora, ar). Tal é o caso das
abordagens biocêntricas em matéria de cuidado com a natureza. Essas mesmas
ideações não são coerentes em sociedades predominantemente hierárquicas, a
exemplo da brasileira.
No
Brasil, a natureza foi inserida como dimensão mais englobante (porque a tudo
influencia) e de menor prestígio na hierarquia social. Dado o lugar reservado à
natureza, compreende-se a dificuldade do estabelecimento de políticas ou de teorias
que favoreçam posturas biocêntricas. Também se compreende o sucesso do
utilitarismo, do conservacionismo e das teses socioambientalistas todos marcadamente
antropocêntricos, dado que priorizam as necessidades humanas face aos interesses
da conservação.
Nesse
caminho, presume-se que orientações restritivas em prol da proteção da
biodiversidade tendam a encontrar, no Brasil, grandes opositores entre a
população em geral e mesmo entre os próprios ambientalistas. Essa circunstância
afeta diretamente disciplinas como a Biologia da Conservação, que parte de
pressupostos individualistas, horizontalizando a relação entre os humanos e a
natureza por meio da atribuição de cidadania às diversas formas de vida e aos
variados ecossistemas (FRANCO, 2013).
Antes
de promover a condenação às propostas preservacionistas que favoreçam a
proteção da biodiversidade em UC desprovidas da presença humana, sugere-se refletir
se o que orienta a crítica não é a insistência na velha representação social,
herdada dos tempos da colônia, segundo a qual a natureza pertence à hierarquia
social e está, antes de tudo, a serviço do homem.
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[1] Não se prolongará a discussão sobre o status dos indígenas nas Américas
Inglesa e Portuguesa. Adota-se o entendimento de Henessy (1978), de que os
indígenas no Brasil foram tratados como “súditos sui generis” da Coroa, até porque os portugueses não estavam em
condições de excluí-los dos seus planos de colonização, tal qual ocorrera nos
EUA. É que o contingente populacional de Portugal não era suficiente para
assegurar o domínio sobre a sua enorme colônia. Assim, quer a catequese dos
indígenas, quer a miscigenação, expressamente estimulada pelo Estado,
funcionaram como estratégias geopolíticas para garantir o domínio luso sobre as
terras sul-americanas (HENESSY, 1978).
[2] De acordo com o dicionário
especializado organizado por Brunel (1997), o mito de Lilith está associado à
criação do mundo e remonta ao cativeiro dos hebreus na Babilônia. Lilith era
considerada a fêmea demoníaca, uma força hostil da natureza, responsável pela
morte de parturientes e nascituros. Às vezes, representada como ave noturna
(mormente a coruja), Lilith, para fins destrutivos, seduzia os homens com sua
beleza, seus longos cabelos e sua sensualidade animal. Em uma versão moderna,
Lilith, também criada do barro, teria fugido do Éden e abandonado Adão, com
quem não se entendia. Deus lhe teria convertido a fuga em expulsão e, desde
então, Lilith tem voltado ao mundo dos homens para impingir males aos
descendentes de Adão e Eva. Na literatura, Lilith aparece como feminino
satanizado: a mulher revoltada que, na afirmação de seu direito à liberdade, à
igualdade e ao prazer, perde a si própria e arrasta aqueles ao seu redor para o
infortúnio, a desgraça e a morte.
[3] A escravidão constitui um dos
principais pontos de comparação entre as culturas brasileira e estadunidense
(OLIVEIRA, 2000), tomados como paradigmas das ideologias hierárquica e
igualitária. São normalmente comparados, entre outros aspectos: ubiquidade ou limitação
da escravidão a determinado espaço físico (CARVALHO, 2011); exclusão social
versus inclusão social do liberto; abolição via guerra civil versus via norma
jurídica; racismo de marca versus racismo de origem (DA MATTA, 1986).
[4] O CNUC é um sistema, administrado pelo
MMA, que integra bancos de dados para fornecer informações padronizadas a
respeito de UC de âmbito federal, estadual, municipal, distrital e particular.
O fornecimento das informações a respeito das UC é de responsabilidade dos
diversos órgãos integrantes do SISNAMA. Limitações de recursos físicos e
humanos dos órgãos estaduais e municipais do SISNAMA podem enviesar os dados,
que estão em constante atualização.
[5] O CNUC mapeou 37.368 km2 de
sobreposição entre UC de proteção integral e de uso sustentável. Nos cálculos
percentuais, subtraímos a área de sobreposição da área total ocupada pelas UC
de uso sustentável.
[i] Socióloga da Companhia
Imobiliária de Brasília. Mestre em Sociologia pela Universidade de Brasília.
Aluna da Pós-graduação Lato Sensu em Direitos Sociais, Ambiental e do
Consumidor do Centro Universitário de Brasília. Doutoranda no Centro de
Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília. E-mail: capra.juliana@gmail.com.